sexta-feira, 17 de maio de 2013

A distinção entre regulamento e lei



Em muitos pontos a lei e o regulamento se assemelham no nosso ordenamento. Em primeiro lugar, tanto a lei como o regulamento parecem dispor de uma base de generalidade e abstração, conforme o direito privado normalmente entende uma lei (art 1º, nº2) pelo que os destinatários das normas em questão seriam generalizados (ao contrario do ato administrativo por exemplo) e o seu teor marcado por abstração. Já a Constituição não é clara na definição da fronteira entre a lei e o regulamento ou entre o domínio legislativo e o domínio regulamentar (art 112º, nº1, por ex.)

No entanto, podemos partir, precisamente dessa fronteira para a distinção entre o regulamento e a lei. O primeiro, dentro do domínio regulamentar, faz parte da função administrativa e tem um caracter secundário da mesma enquanto a lei encontra-se na função legislativa e tem em relação a esta um carater primário. Os regulamentos têm a eles subjacente uma lei, seja no caso dos regulamentos complementares seja no caso dos regulamentos autónomos pelo que o regulamento ou completa e pormenoriza o que está disposto numa lei ou dispõe sobre as competências atribuídas também por uma determinada lei. Este critério de distinção, usado pela escola de direito público alemã, e por Marcello Caetano entre nós, entendia que a lei tinha como característica principal a novidade e que faltava essa mesma característica ao regulamento. Mas era precisamente devido á novidade que o critério falhava. Hoje entende-se pacificamente que os regulamentos autónomos criam direito que entra para uma determinada ordem jurídica. Outro critério de distinção partia da diferença entre pormenores e princípios. Aqueles faziam parte dos regulamentos enquanto que estes faziam parte das leis. Certo é que as Leis emanam princípios com frequência e que poucas vezes nelas existem pormenores e também é certo que os pormenores são frequentes nos regulamentos, mas é ainda mais certo que nada no ordenamento jurídico afasta os princípios dos regulamentos e os pormenores das leis (veja-se, por exemplo, as leis orçamentais).

Para alguns autores, entre eles Freitas do Amaral, a distinção não deve ser feita sob o ponto de vista formal uma vez que tanto a lei como o regulamento são normas jurídicas e ambas com abstração e generalidade. Porém elas provém de diferentes posições hierárquicas uma vez que uma lei pode revogar um regulamento e o mesmo já não será possível e esta situação torna-se ainda mais nítida se constatar-mos que um regulamento contrario á lei é ilegal. Também a posição hierárquica dos órgãos donde emanam estas normas é distinta pelo que isto bastará para fazer uma demarcação do objeto em estudo. Como se disse á pouco a Constituição não define com exatidão a diferença entre o domínio legislativo e o domínio regulamentar pelo que uma lei pode definir com maior exatidão o seu objeto, deixando menos espaço para um regulamento, assim como pode deixar para o regulamento toda a pormenorização do seu objetivo. A distinção também pode ser efetuada consoante o órgão que legisla ou regulamenta se encontre dentro de competências legislativas ou regulamentares.

A importância desta distinção apresenta vários aspetos relevantes do ponto de vista jurídico. Em primeiro lugar a distinção será importante pelo próprio fundamento legal, uma vez que a lei encontra fundamento na Constituição e o regulamento deriva de uma lei de habilitação, seja complementar ou autónomo. Em segundo lugar, esta distinção permite discernir o tipo de ilegalidade, uma vez que um regulamento contrário a lei é ilegal e que as leis podem coexistir ou revogarem-se por contrariedades entre si, como aliás já foi aqui dito. Em terceiro lugar a impugnação contenciosa irá variar conforme estejamos perante uma lei ou perante um regulamento. Na primeira hipótese a única via de impugnação é a da inconstitucionalidade enquanto que na segunda hipótese ao regulamento bastará a própria ilegalidade lato sensu. Esta distinção terá o maior relevo tanto para a garantia de defesa do particular como também para a prossecução do interesse público por parte da administração.

Bibliografia:
Curso de Direito Administrativo, volume II, 2º edição 2010, Almedina, Diogo Freitas do Amaral
Direito Administrativo Geral, tomo III, 2ºedição 2009, D. Quixote, Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado de Matos

1 comentários:

Unknown disse...

Isto refere-se à lei portuguesa correto?
Falta dizer se os artigos, ao longo da página expostos, fazem parte do CRP ou do CC, etc.

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