sábado, 11 de maio de 2013

Contraprestação do Particular: Acto administrativo clausulado ou contrato administrativo?


As relações estabelecidas entre o particular e a Administração não são meramente autoritárias e unilaterais, como é tendente a abordagem mais leiga à Administração Pública. É facto que o exercício do poder administrativo se faz maioritariamente através de actos administrativos, levando a uma europeização do Direito Administrativo, o que, por sua vez, conduziu alguns autores (entre nós, VASCO PEREIRA DA SILVA) ao entedimento de um alargamento do círculo de entidades com competência legal para praticar actos administrativos. Contra, temos alguns autores mais tradicionalistas e conservadores como FREITAS DO AMARAL, mas nem por isso a tese deixa de fazer sentido dado o ecletismo da ciência administrativa e a natural influência de onde outros ramos jurídicos bebem. Por outro lado, melhor não diria OTTO BACHOF, com a concordância de NIGRO: "O acto administrativo já não é mais o centro de gravidade do direito administrativo".
Desta flexibilização resulta que a Administração tenderá a buscar a vantagem conformativa a que se propõe na prossecução do interesse público através de outras técnicas, nomeadamente a técnica contratual, que oferece uma garantia mais estável e segura no tutelar do interesse que a Administração possa ter na prestação do administrado. Convergentemente, PAREJO ALFONSO afirma que "o acordo e a vinculação contratual do cidadão conferem, no interesse de ambas as partes maior consistência e durabilidade ao conteúdo da relação que os une". Por um lado, abre-se a possibilidade de se acoplar ao acto administrativo cláusulas acessórias, nomeadamente condições ou modos. Mas a doutrina assinala alguns pontos importantes no que toca à aposição de condições ou modos no agere administrativo. Sucintamente, foi-se ajustando uma interpretação coloquial de "condição" à tradição administrativa portuguesa, pelo que as demais modalidades de cláusulas acessórias foram afastadas, gerando interpretações deficientes. Não obstante a consagração legal para o efeito por ora sub judice (121º CPA), temos que a imposição de encargos através de cláusulas acessórias poderá suscitar algumas consternações relativamente à vinculação da actividade administrativa à observância de determinados princípios (reserva de lei, igualdade, proporcionalidade), que parece coadunar com a fraca maturação do acto administrativo acessoriamente clausulado. Aqui, a faceta "siamesa" do Direito Administrativo não colheu: Sendo a ciência de fronteira por excelência pela conciliação entre a legalidade (interesse público) e a autonomia privada, não houve, aqui, uma exportação com sucesso dos moldes privatistas.
Por outro lado, o regime de contratos oferece melhores garantias aos particulares, como já referido. A contratação pública é um sistema que já se encontra mais densificado (com um código próprio - Código da Contratação Pública), ao contrário do que sucede com o modo (enquanto cláusula acessória). Para isto e como bem refere BOBELA-MOTA KIRKBY, "basta confrontar a minúcia com que este tipo de contratos são hoje regulados no Título I da Parte III do CCP, com a exiguidade regulatória do modo no quadro do artigo 121º CPA ". O autor refere ainda, em jeito de confrontação, as dificuldades processuais que se levantam no caso de ilegalidade de um modo e no caso de ilegalidade de uma cláusula contratual.
Em jeito de conclusão, podemos afirmar que o particular se encontra melhor protegido quando se opta pela vertente contratual da relação jurídica, dada a segurança e previsibilidade que esta oferece (em concertação com os princípios orientadores de um ordenamento jurídico) no continuum da relação particular-Administração, suprindo de forma mais estável e mutuamente benéfica as possíveis insuficiências que possam surgir do caso concreto.

  Paulo Fernando Ramos


BIBLIOGRAFIA E DIPLOMAS:

- PEREIRA DA SILVA, Vasco. "Em Busca do Acto Administrativo Perdido - Vol. II"
- FREITAS DO AMARAL, Diogo. "Curso de Direito Administrativo - Vol. II"
- BOBELA-MOTA KIRKBY, Mark. "Contratos sobre o exercício de poderes públicos: O exercício contratualizado do poder administrativo de decisão unilateral"
- Constituição da República Portuguesa
- Código do Procedimento Administrativo
- Código da Contratação Pública

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