A revogação do acto
administrativo enquanto mecanismo, acarreta, na sua génese, duas teorias. Para
alguns autores, a natureza da
revogação prende-se com um acto de
natureza negativa ou destrutiva, através do qual, por ilegalidade,
inconveniência ou por via sancionatória, um órgão administrativo cessa os
efeitos de um acto prévio; em oposição a esta corrente, outros autores defendem
a revogação enquanto um acto de natureza positiva ou construtiva, assim nesta
perspectiva, a revogação comportaria um
efeito repristinatório, na medida que, a revogação estaria associada a um não
acompanhamento da extinção do acto anterior de uma nova decisão, embora seja possível
acompanhar o acto anterior com uma nova decisão, e aqui, evidencia-se a característica
construtiva desta corrente.
Pergunta-se se nos
deparamos com uma regra geral, isto é, a revogação será sempre acompanhada de
um efeito repristinatório? Negativamente
responde o Professor Freitas do Amaral, para quem, só se verificará um efeito
repristinatório em situações em que haja duas revogações consecutiva, para
efeitos elucidativos atente-se no artigo 146º do CPA, o qual dispõe:
Artigo
146
Efeitos
repristinatórios da revogação
A revogação
de um acto revogatório só produz efeitos repristinatórios se a lei ou o acto de
revogação assim expressamente o determinarem.
Nem sempre foi o
CPA o diploma responsável pelo funcionamento da revogação, antes deste
encontrava-se na LOSTA, particularmente no seu artigo 18º, o funcionamento da
mesma. Neste diploma somente se distinguia entre o regime de revogação dos
actos constitutivos de direitos e o
regime dos actos não constitutivos de direitos, constata-se então, que a
especificação do regime da revogação ocorreu com o CPA, no qual se procede à
destrinça (com base nos artigos 139º a
141º do CPA) do regime de revogação dos:
- actos insusceptíveis de revogação;
- actos válidos;
- actos inválidos.
No respeitante ao
regime de revogação dos actos insusceptiveis de revogação, seja de observar o
artigo 139º do CPA, o qual enumera os mesmos. São portanto actos insusceptiveis
de revogação: os actos nulos ou inexistentes (por não terem qualquer tipo de
efeitos jurídicos não se verifica procedente a revogação de um acto, à partida
sem efeitos); os actos anulados contenciosamente (nestes também faltando,
previamente, efeitos jurídicos a revogar), e por fim, os actos revogados com
eficácia retroactiva . Todavia, no nº2
do mesmo artigo, conclui-se uma execepção, esta é, os actos cujos
efeitos tenham caducado ou se encontrem esgotados podem ser objecto de
revogação com eficácia retroactiva.
Já nos actos
válidos é de tomar consciência que o artigo 140º do CPA não dispõe de um regime
uniforme para este tipo de actos, distinguindo entre: actos livremente
revogáveis; actos de revogação proibida (140º/1/a e 140/1/c CPA) e actos de revogação
condicionada (140º/1/b e 140º/2). Esmiuçando as alíneas do artigo 140º/1,
verifica-se no proémio do número 1 do artigo 140º que nos deparamos com a regra
geral, directamente correlacionada com o principio da prossecução do interesse
público pela Administração (artigo 4º CPA); a alínea a) remete para a proibição
da revogação dos actos anteriormente praticados pela Administração sob pena de
ilegalidade, se tal proibição não for obedecida, então, rumar-se-á para o desvalor jurídico da ilegalidade do
conteúdo, por fim, a alinea b) trata da revogação condicionada no que concerne
a actos constitutivos de direitos e actos constitutivos de interesses
legalmente protegidos, estes actos são susceptiveis de revogação mediante
certas circunstâncias (circunstâncias estas expressas no nº2 do artigo em
questão). Resta solucionar a questão referente à distinção entre actos
constitutivos de interesses legalmente protegidos e actos que não o sejam, face
a isto, responde Freitas do Amaral que se deve atender ao artigo 6º-A do CPA,
referente ao principio da Boa Fé, verificando deste modo os actos que merecem
tutela face à livre revogabilidade da Administração.
Por sua via, nos
actos inválidos, tende o Direito Administrativo português a defender que o regime
será mais simples que o regime de revogação dos actos válidos, dado que, o acto
inválido por si só, já é um acto ilegal, como tal, o propósito da revogação
será somente liberar o ordenamento de um acto jurídico ilegal; contudo, este
regime tem particularidades face aos demais, nomeadamente o facto do fundamento
exclusivo da revogação residir unicamente na invalidade do acto anterior (por
exemplo, não poderá ser fundamento da revogação , a pretensa invalidade da qual
possa padecer o acto anterior); quanto à competência para revogar estes mesmos
actos, terá de ser de acordo com o artigo 142 do CPA), por último, quanto ao
prazo de revogação, terá este de ser um prazo reduzido.
Como é de constatar
o regime da revogação não é uno e exige conhecimento do tipo de acto que se
pretende revogar, daí a complexidade do mesmo. Tal característica também se
adequa à forma (e formalidades) bem como a competência para revogar actos
administrativos, como será seguidamente enunciado.
No ordenamento
administrativo português não prima a regra da livre forma do acto de revogação,
este está sujeito ao principio da identidade ou paralelismo das formas, através
do qual o acto revogatório deve ter a mesma forma que o acto revogado. Todavia
que tipo de forma? A forma legalmente prevista do acto revogado ou a forma
efectivamente adoptada por este? No que
diz respeito à forma, deve este ser a forma devida, isto é, a forma legalmente
prevista (veja-se o artigo 143º do CPA), embora existam excepções, ou seja,
situações para as quais o acto revogatório não necessita de ter a forma devida
do acto revogado, nomeadamente (a negrito):
Artigo 143.º
Forma dos actos de revogação
1 - O acto de revogação, salvo disposição especial, deve revestir
a forma legalmente prescrita para o acto revogado.
2 - No entanto, deve o acto de revogação revestir a mesma forma que tiver sido utilizada na prática do acto revogado quando a lei não estabelecer forma alguma para este, ou quando o acto revogado tiver revestido forma mais solene do que a legalmente prevista.
2 - No entanto, deve o acto de revogação revestir a mesma forma que tiver sido utilizada na prática do acto revogado quando a lei não estabelecer forma alguma para este, ou quando o acto revogado tiver revestido forma mais solene do que a legalmente prevista.
Já nas formalidades, tal é disposto no
artigo 144º do mesmo diploma, o qual prescreve a observância das formalidades
adoptadas para a prática do acto revogado, havendo, à semelhança da forma, excepções:
quando é disposto legalmente coisas diferente e implicitamente, quando as
formalidades se relacionam somente com o acto revogado e como tal não deverão
ser abrangidas pelo acto revogatório.
Face à competência, observe-se o artigo
142º , o qual enumera os agentes competentes para tal. Comece-se pelo autor do
próprio acto, o competente em primeira instância, fundamentando-se isto na competência
dispositiva do autor do acto. Trata Freitas do Amaral da situação de um acto
praticado por um órgão incompetente, nesse caso quem teria competência para
revoga-lo? O mesmo autor defende a posição de o autor efectivo ser realmente o
agente competente para revogar o acto, embora o CPA não se pronuncie veemente
por uma posição concreta. Ao autor do acto, segue-se o superior hierárquico do
mesmo, advindo a competência deste de um poder se supervisão; o delegante
também ele competente, não se alicerçando o fundamente de tal competência no
poder de supervisão advindo da relação hierárquica, que possa existir, entre o
delegante e o delegado, mas sim, como afirma Marcello Caetano das “(…) posições
relativas do delegante e do delegado”, continuando o primeiro a ter maior
preponderância face ao segundo; enumera-se por último, a competência dos órgãos tutelares, todavia esta competência,
consagrada no artigo 142º/3, é limitada na medida em que tal competência deve estar inserida na
competência geral elencada nos poderes tutelares.
Na revogação, como foi possível constatar,
denota-se uma complexidade enquanto mecanismo, do qual não podem deixar de ser
associados determinados efeitos jurídicos. Finalizando, diferencie-se neste ponto a revogação
anulatória e a revogação ab-rogatória.
Na
primeira, os efeitos do acto revogado são tidos como não produzidos, devido ao
facto desta revogação ser retroactiva ao momento da prática do acto revogado;
na segunda, os efeitos produzidos pelo acto revogado são protegidos, mais
concretamente, mantêm-se inalterados, operando esta revogação no âmbito futuro,
isto é, cessam para o futuro os efeitos que dado acto ainda estivesse apto a produzir.
Por: Cátia Ferrage (SubTurma 1 / Aluna nº 22026)
Bibliografia:
-Amaral, Diogo Freitas do – Curso de Direito
Administrativo Volume II
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