Os Domínios de Aplicação do Princípio da
Responsabilidade do Estado
No
Direito Público, distinguem-se frequentemente três domínios de
aplicação do princípio da responsabilidade do Estado:
- a
responsabilidade civil do Estado por danos causados no âmbito das
suas funções;
- a
responsabilidade criminal dos titulares de cargos políticos;
- a
responsabilidade política destes titulares. Tiago Viana Barra
discorda da autonomização deste último tipo face à
responsabilidade civil e criminal, uma vez que a responsabilidade
política é um instituto sem autonomia para analisar a ilicitude,
a menos que se pretenda uma ordem jurídica sem resposta para todos
os pressupostos da teoria geral da responsabilidade (civil,
criminal ou disciplinar): ilicitude, culpa, imputação da
responsabilidade, prova e nexo de causalidade.
A
Constituição da República Portuguesa separa duas espécies de
responsabilidade de acordo com critérios objectivos e subjectivos –
o tipo de agente responsável (pessoas colectivas públicas ou
titulares de cargos políticos) e o tipo de responsabilidade (civil
ou criminal). A CRP adopta esta duplicação: o artigo 22.º
estabelece a responsabilidade civil do Estado e de outras entidades
públicas, o artigo 120.º estende essa responsabilidade civil aos
titulares de cargos públicos e, por fim, três normas
constitucionais regulam ainda, a título individual, a
responsabilidade criminal do Presidente da República (artigo 130.º),
a responsabilidade criminal dos deputados (artigo 157.º) e a
responsabilidade criminal dos membros do Governo (artigo 196.º).
A
responsabilização patrimonial do Estado tem como objectivo a
compensação de todos os lesados na sua esfera individual de
direitos, ou de qualquer disposição destinada à protecção dos
interesses alheios - salvo se existir obrigação de indemnizar
independentemente de culpa nos casos devidamente previstos na lei. Em
regra, essa lesão terá que se traduzir na prática de um acto
ilícito. Além do ilícito civil, existe também o ilícito criminal
e disciplinar, mais do que limitar o arbítrio do julgador, num
instituto em que tão largo apelo se faz aos seus critérios de bom
senso e de equilíbrio, e até aos seus juízos de equidade, houve a
intenção de auxiliar o intérprete na árdua tarefa de delimitar o
campo da actuação ilícita perante a zona de comportamentos que,
muito embora possam causar danos a outrém, são exigidos ou
sancionados pelo direito, ou indiferentes à ordem jurídica (ou por
ela tolerados). De iure constituto, as situações jurídicas
que alguns autores pretendem integrar no núcleo da responsabilidade
política reportam-se aos casos de direito sancionatório previstos
pela CRP, mas que mais não são do que um desvalor que o legislador
constitucional atribui a certo tipo de condutas de titulares dos
órgãos de soberania. Este direito sancionatório associado à
responsabilidade política destina-se a dar cobertura ao nosso
sistema semi-presidencialista em que a administração pública
depende do governo e este responde perante o parlamento nacional e o
chefe de Estado, pelo que é necessário confrontar as políticas com
os resultados obtidos e fiscalizar a actividade dos funcionários da
administração. Por conseguinte, salvo uma opinião melhor
fundamentada, entende-se que a responsabilidade política não
permite responder a este tipo de desafios. Como refere Pedro Lomba,
mesmo entre os partidários da responsabilidade política, é
bastante notória a dificuldade em justificar certos paradoxos - tais
como a ineficiência da responsabilidade política em face da
deslocação da função de responsabilização para os meios de comunicação social e a sua substituição por formas de
responsabilidade menos ambíguas e flutuantes como a responsabilidade
criminal ou a responsabilidade administrativa.
A
responsabilidade do Estado pode resultar também do exercício de
outras funções do Estado, para além das funções legislativa,
administrativa e judicial. É o caso da função política, por
exemplo, da função de condução das relações externas do Estado,
quando a ilicitude se funde num acto jurídico e não num acto
político. Koechlin faz menção à existência de inúmeras
situações de responsabilidade política pelo exercício da função
diplomática, tais como as questões desencadeadas por protestos de
países prejudicados pela distribuição de benefícios nos tratados
internacionais, os abusos da colonização, ou práticas de
discriminação contra cidadãos estrangeiros. A título meramente
exemplificativo, atente-se num tratado internacional mal negociado
por um Estado com um Estado vizinho sobre caudais de rios, de onde
resulte danos evidentes para pessoas públicas ou privadas do
primeiros dos Estados. Neste caso, o Estado é civilmente responsável
ainda que não o seja pelo exercício das funções legislativa,
administrativa ou judicial.
A
função politica corresponde à prática de actos que exprimem
opções sobre a definição e prossecução dos interesses
essenciais da colectividade, e que respeitam às relações dentro do
poder político e deste com outros poderes políticos,.
A
génese do politico reside essencialmente na realização de escolhas
onde se encontram em causa interesses essenciais do Estado –
colectividade -, que cabem na função política. A definição das
políticas governamentais deve ter em conta a importância das tarefas
que o respeito, a protecção e a promoção dos direitos dos
cidadãos impõem ao Estado.
Como
tal, alguns destes actos podem ter relevância jurídica nacional e
internacional, na medida em que se reportam às relações com outros
poderes políticos (relacionamento do Estado com os demais sujeitos
do Direito Internacional). É o caso - por exemplo - do
estabelecimento de relações diplomáticas ou da declaração de
guerra. Estas situações podem dar origem a casos de responsabilidade internacional do Estado.
A
responsabilidade internacional do Estado tanto pode resultar de
omissão como de um acto positivo. Qualquer destas violações da
ordem jurídica internacional pode ter como fonte quer o Costume, quer
os tratados internacionais.
A
responsabilidade internacional do estado advém em primeiro lugar,
dos actos do seu órgão Deve, contudo, ficar explícito que nem sempre
a actividade de um órgão produz a responsabilidade de um Estado:
basta que ele aja num domínio em que é incompetente e essa incompetência se manifeste.
Para
além da responsabilidade por actos dos seus órgãos, o Estado pode
ser internacionalmente responsável por actos de entidades públicas
territoriais, por actos de entidades não integradas na estrutura do
Estado - embora habilitadas pelo Direito Interno a exercer
prerrogativas de poder público - e por actos de órgãos de um Estado
ou de uma Organização Internacional postos à disposição do Estado territorial Um estado pode ser igualmente responsável pelos actos
de outro quando o representa internacionalmente, não ultrapassando a
sua responsabilidade os actos em que representa o outro no exterior.
A
responsabilidade internacional de um Estado pode, ainda, advir da
prática de crimes comtra a paz.
Diogo
Ilyas Baig, n.º 21955
Bibliografia:
- BARRA, Tiago Viana, A Responsabilidade
Civil Administrativa do Estado
- FONTES, José, Do Controlo
Parlamentar da Administração Pública, 2ª ed., Coimbra, 2009
- ANTUNES
VARELA, João de Matos, PIRES DE LIMA, António Pais, Código Civil
Anotado, vol. I, Coimbra
- OTERO,
Paulo, Direito Constitucional Português, Organização do Poder
Político, Vol II., 2010
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