sábado, 4 de maio de 2013

O acto administrativo e a sua evolução relativamente à sua funcionalidade


Como já se estudou anteriormente, o conceito de acto administrativo teve a sua concepção ligada ao Estado Liberal. Esta evolução acompanhou as mudanças de regimes de Estado que se viveu. Ou seja, no Estado Liberal, com a sua noção de administração agressiva, desenvolveu um conceito de acto administrativo desfavorável e agressivo perante os particulares, sendo este classificado como um “comando”, sendo, segundo Funk, um instrumento regulador e fiscalizador da Administração. Neste caso o acto administrativo afectava a esfera de liberdade individual do particular.

Verificando-se uma transição do Estado Liberal para o Estado Social, houve alterações na funcionalidade do acto administrativo. Esta nova forma de Estado (o Estado Prestador) trouxe ao acto administrativo novos domínios de aplicação, transformando-se a Administração numa administração prestadora para a prossecução de determinados fins. A administração passa a usar tanto a decisão unilateral (por exemplo no direito da segurança social), como o contrato (por exemplo no direito de apoio à construção). Passa a haver uma teorização específica de acto favorável ao particular. Assim sendo, o conceito de acto administrativo passa a englobar tanto a administração agressiva como a prestadora. Segundo Funk, para compatibilizar o acto administrativo com a sua nova vertente prestadora deve-se atribuir a este um grau de abstracção mais elevado, «pelo qual o momento imperativo é entendido, de forma restritiva, como correspondendo à “unilateralidade formal” do acto»
Deste modo, o acto administrativo passa a ser caracterizado pela sua natureza unilateral e não pelo seu caracter autoritário.
Deu-se um alargamento das áreas interventivas do direito administrativo que se converteu nos actos administrativos constitutivos de direitos (acto favorável)
Este acto administrativo favorável pode ser definido como aquele “que cria ou confirma um direito ou uma vantagem juridicamente relevante”, segundo Fafer, ou que “implica o pagamento de uma prestação monetária, ou de uma outra prestação ao cidadão” segundo Bull. Esta característica do acto administrativo, além de ser aceite pela doutrina e pela jurisprudência na sua maioria, consta actualmente no artigo 140º nº1 do CPA.
No entanto, o surgimento da administração conformadora ou de infra-estruturas, vai implicar novas adaptações no conceito de acto administrativo. Trata-se de actos administrativos que têm eficácia em relação a terceiros, integrando-se no âmbito das relações jurídicas plurilaterais. É este Estado planificador que faz com que cada vez mais haja relações jurídicas complexas e multilaterais, sendo estas estabelecidas entre autoridades administrativas e particulares que ocupam diferentes posições de uma mesma ligação jurídica.

Temos como exemplo dado pelo Professor Vasco Pereira da Silva o caso em que é concedida uma licença de construção que favorece o dono dessa mesma mas prejudica a situação fáctica do vizinho que é atingido pelo projecto da obra.

Devido ao facto de se estar perante um acto administrativo com eficácia perante terceiros, podendo afectar múltiplos privados, a lei faz depender as decisões da ponderação e equilíbrio do interesse do privado, do interesse público que o projecto contem e dos terceiros que seriam afectados assim como as suas consequências previsíveis. É  por todos os terceiros afectados que estes devem participar no procedimento, podendo até mesmo impugnar contenciosamente a decisão, pela defesa dos seus direitos subjectivos.
É para a defesa dos direitos subjectivos dos particulares que lhes são concedidos por lei poderes de intervenção no procedimento administrativo (tutela preventiva) e no contencioso administrativo (tutela repressiva).

Pode-se, portanto, concluir que o acto administrativo tem-se vindo a adaptar aos enquadramentos históricos pelos quais a Administração Pública passa. É derivado do tipo de funcionamento e de organização da Administração Pública que o acto administrativo adapta as suas funções.
Neste momento, apesar de o acto administrativo atravessar uma “crise”, que derivou da perda do seu estatuto de instrumento exclusivo de ligação da Administração com os particulares, não se deu o esgotamento desta forma de actuação da Administração Pública, havendo sim uma nova concepção que foi reconduzida a um simples momento de um relacionamento duradouro entre o particular e a administração, sendo este reconstruido de acordo com as novas realidades administrativas.

 

Bibliografia:

Diogo Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo II, Almedina

Vasco Pereira da Silva, Em Busca do Acto Administrativo Perdido, Almedina

 

 

Marisa Gomes

Aluna nº 21935

 

 

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