Verificando-se uma transição do
Estado Liberal para o Estado Social, houve alterações na funcionalidade do acto
administrativo. Esta nova forma de Estado (o Estado Prestador) trouxe ao acto
administrativo novos domínios de aplicação, transformando-se a Administração
numa administração prestadora para a prossecução de determinados fins. A
administração passa a usar tanto a decisão unilateral (por exemplo no direito
da segurança social), como o contrato (por exemplo no direito de apoio à
construção). Passa a haver uma teorização específica de acto favorável ao
particular. Assim sendo, o conceito de acto administrativo passa a englobar
tanto a administração agressiva como a prestadora. Segundo Funk, para
compatibilizar o acto administrativo com a sua nova vertente prestadora deve-se
atribuir a este um grau de abstracção mais elevado, «pelo qual o momento
imperativo é entendido, de forma restritiva, como correspondendo à “unilateralidade
formal” do acto»
Deste modo, o acto administrativo passa a ser caracterizado pela sua
natureza unilateral e não pelo seu caracter autoritário.
Deu-se um alargamento das áreas interventivas do direito
administrativo que se converteu nos actos administrativos constitutivos de
direitos (acto favorável)
Este acto administrativo favorável pode ser definido como aquele “que
cria ou confirma um direito ou uma vantagem juridicamente relevante”, segundo
Fafer, ou que “implica o pagamento de uma prestação monetária, ou de uma outra
prestação ao cidadão” segundo Bull. Esta característica do acto administrativo,
além de ser aceite pela doutrina e pela jurisprudência na sua maioria, consta
actualmente no artigo 140º nº1 do CPA.No entanto, o surgimento da administração conformadora ou de infra-estruturas, vai implicar novas adaptações no conceito de acto administrativo. Trata-se de actos administrativos que têm eficácia em relação a terceiros, integrando-se no âmbito das relações jurídicas plurilaterais. É este Estado planificador que faz com que cada vez mais haja relações jurídicas complexas e multilaterais, sendo estas estabelecidas entre autoridades administrativas e particulares que ocupam diferentes posições de uma mesma ligação jurídica.
Temos como exemplo dado pelo Professor Vasco Pereira da Silva o caso
em que é concedida uma licença de construção que favorece o dono dessa mesma
mas prejudica a situação fáctica do vizinho que é atingido pelo projecto da
obra.
Devido ao facto de se estar perante um acto administrativo com eficácia
perante terceiros, podendo afectar múltiplos privados, a lei faz depender as
decisões da ponderação e equilíbrio do interesse do privado, do interesse
público que o projecto contem e dos terceiros que seriam afectados assim como
as suas consequências previsíveis. É por
todos os terceiros afectados que estes devem participar no procedimento,
podendo até mesmo impugnar contenciosamente a decisão, pela defesa dos seus
direitos subjectivos.
É para a defesa dos direitos subjectivos dos particulares que lhes são
concedidos por lei poderes de intervenção no procedimento administrativo
(tutela preventiva) e no contencioso administrativo (tutela repressiva).
Pode-se, portanto, concluir que o acto administrativo tem-se vindo a
adaptar aos enquadramentos históricos pelos quais a Administração Pública passa.
É derivado do tipo de funcionamento e de organização da Administração Pública
que o acto administrativo adapta as suas funções.
Neste momento, apesar de o acto administrativo atravessar uma “crise”,
que derivou da perda do seu estatuto de instrumento exclusivo de ligação da
Administração com os particulares, não se deu o esgotamento desta forma de
actuação da Administração Pública, havendo sim uma nova concepção que foi
reconduzida a um simples momento de um relacionamento duradouro entre o
particular e a administração, sendo este reconstruido de acordo com as novas
realidades administrativas.
Bibliografia:
Diogo Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo II, Almedina
Vasco Pereira da Silva, Em Busca do Acto Administrativo Perdido,
Almedina
Marisa Gomes
Aluna nº 21935
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