domingo, 19 de maio de 2013


Vícios tradicionais do acto administrativo

                Foi no Direito Administrativo Francês, no séc. XIX, que nasceu a teoria dos vícios do acto administrativo. Na altura, o único mecanismo de reacção dos particulares contra os actos ilegais da Administração era o recurso por excesso de poder e foi deste conceito que nasceram outros conceitos como a incompetência, o vício de forma, a violação da lei e desvio de poder.
                Em Portugal, foi só a partir dos anos 30 do séc. XX, com o Prof. Marcello Caetano, que se começou a poder falar de uma distinção de vícios: usurpação de poder, incompetência, vício de forma, desvio de poder e violação da lei, mas esta era somente na doutrina. Só em 1956 se introduziu uma enumeração legal dos vícios (com a Lei Orgânica do Supremo Tribunal Administrativo). Com a entrada em vigor do Código de Processo dos Tribunais Administrativos, que revogou a LOSTA, em 2003, deixou de haver essa enumeração legal, embora a lei se refira aos vícios.
                Há quem defenda a simples invocação da ilegalidade do acto ou a demonstração da lesão de quaisquer posições jurídicas subjectivas dos particulares, sem ser necessário a especificação do vício ocorrido, sustentando a sua opinião no texto do artigo 268º nº4 da Constituição da República Portuguesa. Contudo, as disposições de lei ordinária têm vindo a exigir a especificação do vício, no que concerne ao contencioso administrativo, para além de que a especificação é útil para efeitos de economia processual. Na verdade, a função do 268º nº4 é de garantia do recurso contencioso contra todos os actos administrativos arguidos de ilegalidade e de violação de posições jurídicas substantivas dos particulares.
                Verifica-se que a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo sempre aceitou o facto de o tribunal poder corrigir a qualificação jurídica dos vícios alegados pelas partes (erro inicial na qualificação dos vícios, como tal, não prejudica dos direitos no recurso contencioso). Também nenhuma ilegalidade fica excluída de fiscalização, uma vez que se admite sempre um vício residual, onde cabem todas as ilegalidades que não se reconduzem aos outros vícios, sendo que esse vício residual é a violação da lei.
                Actualmente, o autor de uma acção administrativa especial de impugnação do acto administrativo tem que expor na petição as razões de direito que fundamentam a acção (78º nº2 g) CPTA) e se referir às causas de invalidade do acto impugnado (85º nº3 e 95º nº2 CPTA).
                Procedendo à caracterização e definição dos cinco vícios tradicionais do acto administrativo, já salientados:
a)      Usurpação do poder: consiste na prática por um órgão administrativo de um acto incluído nas atribuições do poder legislativo, moderador ou judicial. É uma ilegalidade orgânica e traduz-se na violação do princípio da separação de poderes. Os actos com este vício serão nulos.
b)      Incompetência: é o vício que consiste na prática por um órgão administrativo de um acto incluído nas atribuições (caso em que o acto será nulo) ou na competência de outro órgão (caso em que acto será anulável). É uma ilegalidade orgânica.
c)       Vício de poder: é a preterição de formalidades essenciais anteriores à prática do acto ou carência de forma legal. É uma ilegalidade formal. Actos compadecidos com este vício serão nulos na maioria dos casos.
d)      Violação da lei: é a discrepância entre o conteúdo ou o objecto do acto e as normas jurídicas que lhes são aplicáveis. É uma ilegalidade de natureza material. Este vício produz-se normalmente no exercício de poderes vinculados e de poderes discricionários, sendo que os actos constantes no 133º CPA serão nulos e os restantes serão anuláveis.
e)      Desvio de poder: exercício de um poder discricionário por um motivo principalmente determinante, que não condiga com o fim que a lei visou ao conferir tal poder. É uma ilegalidade material que assume a modalidade de desvio de poder para fins de interesse público (para o qual o Supremo Tribunal Administrativo requer apenas simples erro, sendo então os actos somente anuláveis) e de desvio de poder para fins de interesse privado (para o qual o Supremo Tribunal Administrativo exige dolo, sendo, por isso, os actos nulos).
Salienta-se ainda o facto de os vícios do acto administrativo serem acumuláveis, ou seja, um acto administrativo poder ser ilegal por mais que um vício.

Bibliografia:
Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado de Matos “Direito Administrativo Geral – Actividade Administrativa” Tomo III;
Diogo Freitas do Amaral “Curso de Direito Administrativo” Volume II.

Diana Furtado Guerra
Nº 21984

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