No decorrer do séc. XX, com a viragem do Estado
Liberal para o Estado Social, dá-se uma grande transformação nas economias
ocidentais num sentido intervencionista. O Estado passou a reivindicar também
para si direitos de gestão. Começando a explorar, em grande número, empresas
agrícolas, comerciais e industriais.
Essencialmente após a 2ª Guerra Mundial, um dos
motivos mais relevante para a criação de empresas públicas, foi o de incentivar
o desenvolvimento económico e assegurar a produção de determinados bens e
serviços.
A Administração toma a iniciativa de lançar empresas
destinadas a quebrar a estagnação de determinados sectores da economia. Em que na
maioria dos casos, o Estado mostra-se ser a única entidade capaz de reunir os
capitais necessários à sua organização em dimensões satisfatórias.
No entanto, não só esses motivos mais imediatos se
mostram relevantes para a criação de empresas públicas. A convicção de que o
interesse geral exige que certas atividades económicas fundamentais, fossem
subtraídas à esfera da livre iniciativa particular orientada pelo critério do
maior lucro; a prestação de bens ou serviços em condições que a iniciativa
privada não poderia satisfazer; as atividades
em relação as quais se faz sentir a necessidade de evitar fraudes e
irregularidades; para a prestação direta de bens ou serviços à própria
Administração e sua modernização; são outros do motivos que importam referir.
A
necessidade de que em certos sectores a atividade económica deva ser desenvolvido
em regime de monopólio (ex. monopólios naturais), levanta algumas questões
sobre a validade desse motivo de criação de empresas públicas. O art 8º nº1 do DL nº 300/2007 refere que
“as empresas públicas estão
sujeitas às regras gerais de concorrência, nacionais e comunitárias”. Num mercado monopolista, não existe
atomicidade, pelo que não se aplicam as regras gerais de concorrência. No
entanto, a existência de um monopólio nas mãos de particulares, não se mostra
conveniente. É defensável, que em prossecução do interesse publico, se justifique
que o sector em regime de monopólio se converta em empresa pública.
Antes de avançarmos no tema, é
importante clarificar o conceito de empresa. Para Augusto de Ataíde, empresa é “toda a unidade de produção que corresponde à organização de fatores
para a produção de bens e serviços, com o objetivo de obtenção de um benefício
através da respetiva alienação. A empresa é criada com o intuito de se
conseguir que a remuneração das utilidades produzidas, seja superior ao respetivo
custo, isto é, com o objetivo de realização de um lucro.”
Daqui retiramos a característica fulcral que
distingue as empresas dentro das unidades produtivas, ter como finalidade
estatutária ou institucional, a obtenção de lucro. Mesmo que uma empresa não
apresente lucro, não significa que não seja possível aplicar o conceito de “empresa”.
Pois mesmo que apresente uma balança deficitária, o que releva é a sua
finalidade lucrativa.
Definição de empresa publica
A noção de empresa pública suscita algumas divergências
quanto aos seus elementos caracterizadores.
Para alguns Autores, serão públicas as empresas cujo
capital seja total ou predominantemente público (critério do capital público).
Para outros, serão públicas as que forem dirigidas pela Administração (critério
da direção publica).
Ainda noutras correntes, defendem-se que para ser pública
a empresa deve prosseguir o interesse público; ou que conjugue entre si os dois
critérios fundamentais, dizendo que a empresa pública é a que, ao mesmo tempo é
dirigida pela administração e tem capitais públicos (pelo menos em maioria)
Para a
classificação de empresas enquanto publicas, o prof. Marcello Caetano considera
como elementos essências:
a) Capital no todo ou em parte proporcionado por Pessoa
Coletiva de Direito Público
b) Predomínio na sua direção e na fiscalização por
parte de representantes da Pessoa Coletiva de Direito Publico
c) Autonomia financeira
d) Produção de bens e serviços destinados à venda por
um certo preço
Para o prof. Marcello Caetano, o fim lucrativo não é
essencial ao conceito de empresa pública, pois “como organização financeiramente autónoma deve procurar bastar-se
cobrindo os gastos com as próprias receitas.” Sendo bastante, para se
considerar como empresa pública, encontrar-se na fronteira entre as unidades de
produção não empresariais e as empresariais
O Decreto-lei nº 300/2007 de 23 de Agosto, visa regular genericamente o sector
empresarial do Estado, e distingue três espécies de empresas:
1) As empresas públicas sob forma privada, que são
sociedades controladas pelo Estado.
2) As empresas públicas sob forma pública, que são
pessoas coletivas públicas
3) As empresas privas participadas pelo Estado, que
não são empresas públicas, mas integram igualmente o SEE.
Os elementos essenciais acima referidos, ganham importância
e relevo diferentes conforme estejamos perante empresas públicas sob forma pública
ou sob forma privada.
Nas empresas públicas sob forma pública, o elemento
“prossecução de lucro” ou pelo menos equilíbrio e mera cobertura de custos é decisivo,
pois, permite, recortar de entre todas as unidades de produção, as que são de serviços
administrativos e aquelas que têm natureza empresarial. E nesse caso os
elementos “capital público” e “direção pública” têm menos importância.
Enquanto que, se estivermos perante empresas públicas
sob forma privada, o critério do lucro deixa de ter interesse determinante.
Pois todas as sociedades comerciais têm em princípio fim lucrativo e autonomia
financeira, o que torna difícil saber se estamos ou não em face de uma empresa
pública. Nesta situação, são os critérios do capital e da direção, que permitem
estabelecer a distinção entre as sociedades que são e que as não são empresas públicas.
O
artigo 3.º do DL
nº 300/2007 reporta que:
“1-
Consideram -se empresas públicas as sociedades constituídas nos termos da lei
comercial, nas quais o Estado ou outras entidades públicas estaduais possam
exercer, isolada ou conjuntamente, de forma directa ou indirecta, uma
influência dominante em virtude de alguma das seguintes circunstâncias:
a)
Detenção da maioria do capital ou dos direitos de voto;
b)
Direito de designar ou de destituir a maioria dos membros dos órgãos de
administração ou de fiscalização.”
2-
São também empresas públicas as entidades com natureza empresarial reguladas no
capítulo III.”
O nº 2 do
artigo 3º remete para o capitulo III, onde se dispõe no artigo 23º nº1:
“Regem
-se pelas disposições do presente capítulo e, subsidiariamente, pelas restantes
normas deste diploma as pessoas coletivas de direito público, com natureza empresarial,
criadas pelo Estado e doravante designadas «entidades públicas empresariais”
Daqui podemos extrair que, não tem que haver
necessariamente maioria de capital para que a empresa seja pública, pode haver
em alternativa direitos especiais de controlo que dêem sobre a empresa uma
influência dominante por parte do
Estado ou de outras entidades públicas estaduais. Também é possível retirar do
disposto, que a forma jurídica da empresa pública é irrelevante para a
definição do respetivo conceito.
A sua forma jurídica ganha relevância no momento da
sua criação.
A criação de empresas publicas que revistam a forma de
sociedade é feita “nos termos da lei comercial” art 3 nº1 DL nº300/2007
Enquanto a criação de empresas públicas empresariais é feita
por decreto-lei (art 24º nº1)
O controlo feito por parte do Governo também diverge, consoante
a sua forma jurídica.
Sob
forma privada:
- O Estado é detentor de direitos acionistas (art. 10);
- As empresas estão sujeitas a um controlo financeiro (art.
12);
- E a um dever de prestação de informação (art. 13).
Sob
forma pública
- As empresas públicas estão sujeitas a uma tutela económica
e financeira (art. 29);
- E aos demais poderes que a tutela abrange (p.e aprovação
de planos e orçamentos)
Em ambas as formas jurídicas, as empresas públicas estão
sujeitas às orientações estratégicas do Governo (art. 11º).
Gestão privada
das empresas públicas.
De um modo geral as empresas públicas estão sujeitas ao
direito privado, o que não deixa de ser curioso visto serem públicas. A partida
faria mais sentido estarem sujeitas ao Direito Publico. No entanto a atividade
que desenvolvem não é de gestão pública, e sim de gestão privada.
Pela própria natureza e especificidade da atividade que
exercem, necessitam de utilizar instrumentos, técnicas e métodos de atuação que
sejam mais flexíveis, ágeis e expeditos. Podendo assim adaptar-se melhor e de
forma mais célere às realidades de um mercado em constante mudança.
Seria inimaginável aplicar os mesmos métodos burocráticos que
Administração usa para a sua própria gestão e organização. Nem seria possível pôr
em prática o art 8º nº1 do DL 300/2007, pois as empresas públicas estariam
claramente em desvantagem perante as empresas privadas.
As empresas públicas só poderão funcionar devidamente e com êxito,
se puderem legalmente aplicar os métodos próprios das empresas privadas.
Importante fazer referencia, que o direito privado não se
aplica automaticamente às empresas públicas, mas porque o Direito
Administrativo manda aplicar-lhes o direito privado. (art. 7º nº1).
No entanto, é sempre possível, quando necessário e em
situações excepcionais, a empresa pública recorrer ao direito público (art. 14º
nº 2)
Nos termos do art 18º nº 2 compete aos tribunais judiciais o
julgamento da generalidade dos litígios em que seja parte uma empresa pública. Mas
nos casos em que segundo o art 14º, as empresas públicas exerçam poderes de
autoridade, os litígios daí emergentes serão de competência dos tribunais
administrativos.
Bibliografia:
Curso de Direito Administrativo, vol. I – Diogo
Freitas do Amaral
Manual de Direito Administrativo – Marcello
Caetano
Elementos para um curso de Direito Administrativo da
economia – Augusto de Ataíde
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