Na transição para o século XX
surge um novo modelo de Estado, diferente daqueles que até então vigorava, o Estado
de Direito ou Estado Social. Anteriormente, o Estado, que estava preocupado apenas
com o domínio político, confronta-se agora com a necessidade de “tomar as rédeas”
de outras áreas que não aquela e que não se encontravam sob o seu domínio: a questão
social e as crises cíclicas do capitalismo dos finais do século XIX e inícios
do século XX colocaram novos desafios ao poder político que é chamado a
desempenhar funções de tipo económico e social. O pacto social do liberalismo é
revisto e é-lhe acrescentado um “novo contrato social que as nossas sociedades
propõem aos cidadãos e que as transforma em sociedades seguradoras” (F. Ewald).
Este novo modelo de Estado vai
passar por um processo evolutivo, de progressivo desenvolvimento e sofisticação
e produz grandes alterações no âmbito do Direito Administrativo, entre muitas, a
maior importância da Administração Pública em detrimento do legislador.
Santamaria Pintor distingue três
fases no Estado Social: uma fase de intervenção estadual na regulação da
relação laboral, que leva o Estado a intervir autoritariamente no domínio das
relações de trabalho enfrentando as desastrosas consequências que para a classe
operária tinham tido a industrialização; uma fase de intervenção generalizada
do Estado no funcionamento da economia, durante a qual o Estado vai chamar a si
a orientação e a regulação da actividade económica e financeira exercendo mesmo
tarefas produtivas e por último, a sua fase de apogeu, no final da Segunda
Grande Guerra, na qual se transforma num Estado prestador.
A grande modificação introduzida
pelo Estado Social tem a ver com o crescimento quantitativo e qualitativo das
funções por si desempenhadas, visível através de um aumento da intensidade das
funções tradicionais (polícia e defesa) e do surgimento de novas tarefas nos
domínios económicos e sociais (no sentido de prover ao conjunto da sociedade os
sistemas vitais – emprego, segurança, saúde, entre outros).
O Estado Social caracteriza-se pela
actividade administrativa, já que a sua missão é a de assegurar o bem-estar dos
indivíduos e da sociedade. Isto significa que a mudança de modelo estadual
implicou transformações ao nível da função administrativa que passa de
agressiva a prestadora, o que leva ao aumento da dependência dos indivíduos de
deveres públicos. Deste modo, é necessário repensar a Administração o que se
traduz, consequentemente, numa mudança radical nesta. Desaparece então a
clássica separação entre Estado e sociedade e também entre Administração e
privados, estes dois estão ligados por relações duradouras que implicam
interpenetração e colaboração recíprocas. Esta relação traduz-se: no
estabelecimento de relações de prestação que, tendo como subjacente a lógica de
realização do bem-estar individual e colectivo através da intervenção
administrativa, afastavam a concepção liberal de que tanto os indivíduos como a
sociedade veriam os seus interesses melhor defendidos, quanto menor fosse a actuação
dos poderes políticos; na valorização do procedimento administrativo ligado à
ideia da participação dos cidadãos no processo de tomada de posse e, por fim,
no crescimento do aparelho administrativo determinado pelas novas funções do
Estado prestador.
A alteração da relação entre
Administração e os privados implica o reconhecimento dos direito subjectivos
dos particulares perante os poderes públicos.
A partir da década de 70 nota-se
um esgotamento do modelo de Estado-Providência, incapaz de dar uma resposta
satisfatória aos mais recentes problemas colocados pela evolução da sociedade. A
crise do Estado social surge como consequência de um conjunto de circunstâncias
que vêm mostrar as limitações desse modelo de organização estadual para
responder às novas exigências de carácter político, económico e social. Nesta
época a realidade vai ser reafirmada pelas Constituições que vão surgindo. Surge
o verdadeiro movimento social (que já se havia iniciado em 1949 mas que não
pode ser considerado como tal) e ainda uma europeização do Contencioso
Administrativo (anos 80).
Chama-se ao novo modelo de
Administração que surge nos anos 70 uma Administração infraestrutural.
Nesta nova forma de ver o Estado
coexistem opções em princípio contraditórias como a generalização e a
enfatização de valores individualistas e, por outro lado, a persistência de
valores de solidariedade social.
É um período de crise do modelo
de Estado e ainda do modelo económico (estagflação), o que leva a repensar o
papel preponderante que o Estado tinha na Economia, e desse modo a diminuir a
sua influência na mesma.
Iniciam-se as transformações no
contexto do Direito Administrativo, através de uma reafirmação da natureza
jurisdicional do Direito Administrativo e uma transformação deste, que se torna
num Direito mais subjectivo, havendo uma importância renovada dos direitos dos
particulares. Assim podemos dizer que neste período o particular é um sujeito
de Direito que tem relações com a Administração. Procedem-se, neste período, a diversas
transformações que se devem: à ineficiência económica da intervenção do Estado
que cresceu muito; ao constante aumento das contribuições dos indivíduos para o
Estado, mais do que proporcional às prestações dele recebidas, gerando um
sentimento de desconfiança e ao alheamento dos cidadãos face aos fenómenos
políticos.
Surgem com os novos tempos, novas
preocupações, embora na verdade não se descarte, por completo, a realidade
anterior, apenas se constitui um novo modelo tendo em conta que são também
novos os desafios e as necessidades a que se tem de dar resposta, sendo
portanto “mais um momento na História do Estado”, segundo o Professor Vasco
Pereira da Silva.
De acordo com o mesmo, a crise do
Estado social constitui a face visível de um processo de transformação e de
revitalização dos fenómenos políticos, o que significa, na opinião do
Professor, não o desaparecimento do Estado mas sim do modo de o entender.
O problema está em saber se a
realidade actualmente conhecida ainda pode ser compreendida no seu acervo
tradicional.
É
preciso olhar para a História para não se cometerem os mesmos erros, pois
devemos aprender com eles. É ao que, hoje em dia, deve precisamente atender-se,
tendo em conta a situação em que o Estado e a Administração se encontram. Tendo
em vista os problemas e as crises do modelo de Estado que surgem ciclicamente e
que cada vez são menos espaçadas, é necessário perceber se não se deveria proceder
à alteração do paradigma de Estado que existe.
Assim
como aconteceu na transição para o século XX, vivemos um período de grave crise
económica e de grandes problemas a nível social. É portanto imperativo que
reconheçamos que a História tem o seu valor, guiando-nos por ela para que não
sejam cometidos os mesmos erros e que se proceda a uma nova alteração do
modelo de Estado, para que este consiga dar resposta a várias questões a que hoje
em dia já não consegue. Deve tentar-se pegar naquilo que foi feito e proceder
às devidas alterações para que consigamos chegar a Estado mais eficaz a nível
de resposta às necessidades sociais.
O
Direito Administrativo pode ser considerado como uma das causas da crise,
devido às falhas na regulação (sector financeiro) e também às falhas na
contratação pública (no que toca às parcerias público-privadas. No entanto,
podemos também ver este ramo do Direito como uma solução para a crise, se
certas medidas forem tomadas. Mais concretamente, deve proceder-se a um
incremento da “boa governação pública” e também da “boa regulação pública”,
assim como também se deve atender a uma gestão eficiente e alocação justa de bens
escasso, à alienação de bens e agilização do regime do domínio público.
Inclui-se aqui também a justiça, que precisa de ser praticada de forma mais
célere e eficiente.
Temos
as ferramentas para travar esta situação de crise em que se encontra o modelo
actual Estado, provocada pelas realidades externas a este, principalmente pela situação de crise que assola o nosso país, iniciada nos Estados Unidos da América em 2007. Devemos então
atender a essas mesmas ferramentas e proceder à sua utilização, de maneira a
que seja ultrapassado este momento de “ruptura” em que nos encontramos. O Estado
deve actualizar-se em relação aos problemas que afectam a sociedade e proceder
à sua própria transformação, como já anteriormente aconteceu, através de uma
reforma da Administração Pública e da regulação pública, assim como o Direito
Administrativo se deve também adaptar a este período de crise.
Sara Oliveira, nº21870
0 comentários:
Enviar um comentário