A história da figura da freguesia
pode ser dividida em três grandes períodos correspondentes a diferentes papeis
que, a figura tomou, na sua relação com a administração e com o direito
Administrativo: o primeiro grande período começa na ocupação romana da península
ibérica e vai durar até à fase liberal de 1830. A freguesia era por esta altura
uma organização puramente eclesiástica, formada em torno de uma determinada
igreja. A própria palavra Freguesia nasce da expressão filli eclesiae (Filhos da Igreja). Por esta altura, em Portugal, a
freguesia só tinha expressão nas zonas rurais do pais, donde nasceu a
preocupação de entre a comunidades eclesiásticas escolher alguém que pudesse
tratar dos problemas relacionados com a convivência em comum. Logicamente,
neste período, a freguesia não fazia parte da Administração pelo que a sua
importância era meramente religiosa e
civil; o segundo período surge-nos com a revolução liberal e passa a incorporar
a freguesia na administração pública. Nesta altura assiste-se a uma indecisão
geral sobre o papel da figura e sobre a sua integração ou não na administração
local; Essa indecisão termina quando começa o terceiro período da história das
freguesias em Portugal, com a aprovação do código Administrativo de 1878, que
coloca de forma definitiva as freguesias na estrutura da Administração local
autárquica, e esta decisão surge-nos até aos nossos dias.
Hoje em dia, no panorama atual,
podemos classificar as freguesias em urbanas e rurais, consoante a sua inclusão
numa área de um município urbano ou numa área de município rural. Outra
classificação determina, no que toca à dimensão populacional, as freguesias de
1ª ordem, 2ª ordem e 3º ordem. Importa agora perceber quais serão, então, as
funções e atribuições das freguesias, e para tal podemos, como faz o Prof. Freitas do Amaral,
classificar três grande tipos de atribuições, mas repare-se que todas estas
atribuições são sempre definidas por lei, como é regra imperativa em Direito
Público. A Lei 159/99, sobre a transferência de atribuições e competências para
as autarquias locais, bem como a Lei das Autarquias Locais vão fornecer a
importante base legal para entendermos as atribuições dadas a esta figura. O
primeiro tipo de atribuições consagra-se no plano politico: são as freguesias
que tratam do recenseamento eleitoral e que tratam de grande e importante parte
do processo eleitoral seja para que eleições for. Neste plano complementam
outras figuras como a comissão nacional de eleições e contribuem decisivamente
para o processo democrático nacional. O segundo grande tipo de atribuições
respeita ao plano económico: é da competência das freguesias a gestão de certos
bens públicos como baldios, águas públicas ou cemitérios bem como a construção
e manutenção de caminhos, estradas, ruas e todas as outras vias de comunicação
que se encontrem na sua área de atuação. O terceiro tipo de atribuições
desenvolve-se no plano cultural e social: como o tratamento da assistência
social, tarefas sobre saúde pública e gestão de certos equipamentos como
teatros ou pavilhões por exemplo.
Para completar uma pequena
análise às freguesias, nos dias de hoje, à que fazer referencia aos órgãos que
as compõem. São dois os órgãos previstos por lei para a composição orgânica de
uma freguesia: a assembleia de freguesia e a junta de freguesia. As assembleias
de freguesia são, por excelência, o órgão representativo dos habitantes daquela
região, e os seus membros variam muito consoante o número de eleitores de cada
freguesia, ou seja, de acordo com a classificação em cima apontada, é o artigo
5º da LAL que vai estabelecer o número de membros. Segundo o artigo 13º do
mesmo diploma, as referidas assembleias devem reunir, ordinariamente quatro
vezes durante o ano civil, pelo menos. Este órgão colegial deve assumir como
função a fiscalização das atividades da junta de freguesia bem como tratar da
sua eleição. É neste órgão que se discutem os orçamentos, as contas, as
aprovações de regulamentos e todas as decisões de orientação geral. Note-se que
a lei reserva sempre para a assembleia de freguesia a decisão dos casos mais
importantes sobre a freguesia. Todas estas funções estão expostas no artigo 17º
da LAL. O outro órgão da freguesia é a Junta de Freguesia, composto com um
Presidente e por vogais (artigo 30º da LAL). Deve, este órgão, reunir pelo menos,
ordinariamente, uma vez por mês. As funções deste órgão estão plasmadas no
artigo 34º do referido diploma, e tratam da competência da Junta para executar
as deliberações da Assembleia de Freguesia, execução de Leis, o estudo dos
problemas da freguesia e as respetivas soluções, assegurar a gestão orçamental
pessoal e dos bens públicos, bem como gerir de forma regular as obras a cargo
da freguesia. Tem, também, a Junta, a função de apoiar as iniciativas que
surjam relacionadas como o desenvolvimento social, cultural, desportivo e
outros. Por ultimo, refira-se, que pode a Junta de Freguesia exercer
competências delegadas pela Câmara Municipal correspondente.
Existem ainda duas figuras que,
não fazendo parte da Freguesia, a complementam no sentido da prossecução do
interesse público: são as associações de Freguesias e as comissões de
moradores. Quanto às primeiras, elas surgem da necessidade de fazer face a
problemas comuns de que devem as freguesias tratar, estas associações para além
de sede legal, LAF, têm ainda acolhimento constitucional, artigo 247º da CRP.
Destas associações surgem novas pessoas coletivas públicas com órgãos próprios,
prontas também elas, a prosseguir o interesse público. Quanto às comissões de
moradores, também elas previstas constitucionalmente, a sua criação constituiu,
depois do 25 de Abril, uma forma de desconcentração e de aproximação do
particular á administração, mas o desenvolvimento social, politico e mesmo
administrativo veio retirar importância a estas comissões que hoje em dia não
refletem as ideias do legislador constituinte.
Atualmente, assiste-se a um
debate nacional em torno da figura das freguesias, discutindo-se a sua viabilidade,
o seu peso politico, administrativo e a cima de tudo financeiro. Ao realizar-se
a extinção das freguesias estima-se que o governo poupe cerca de 6,5 milhões de
euros por ano, segundo a associação nacional de freguesias, numa redução
prevista para cerca de 1500 freguesias. O que aqui estará em causa será não só
uma reorganização administrativa mas também uma tentativa de redução da despesa
pública, numa altura de crise económica. Mas a pergunta que se poderá fazer é
se essa reorganização e essa poupança serão suficientemente pertinentes e necessárias
para que possam passar por cima de princípios
básicos de Direito Público. A freguesia
é, hoje em dia, um importante centro politico capaz de prestar direta ou
indiretamente serviços vitais, na organização administrativa, como a educação
ou a saúde, é, também, para muitas pessoas, nomeadamente da região do interior,
a única forma de contacto que têm com o poder politico e, se tão importante em
Democracia é a relação entre o particular e o poder, as freguesias tornam-se ai
fundamentais. É na freguesia que se desempenham com mais vigor funções vitais
em qualquer verdadeiro Estado de Direito, como a assistência social e a ajuda
direta à pobreza e precariedade. Quando
pensamos nisto tudo e tendo ainda em conta a atual situação económica e social
do pais, bem como as más perspetivas de futuro, torna-se urgente salvaguardar
esta figura.
Tudo o que aqui foi dito releva
do ponto de vista Administrativo e Constitucional. O principio da aproximação
dos serviços às populações é concretizado significativamente pelo papel das
freguesias, e percebe-se pensando no caso de uma população do interior do pais,
como já se tinha dito. A própria Constituição prevê de certa forma este
principio que se torna fulcral quando se trata de regiões menos povoadas e
desenvolvidas do território nacional. Ora, não é acabando com cerca de 1500
freguesias que se vai cumprir a norma programática da Constituição no artigo
267º. O próprio principio da descentralização parece, também, estar aqui em
jogo, quando a lei fundamental, prevê que a administração seja cada vez mais, e
dentro dos limites, descentralizada. Mais, impõe a, mesma Constituição no
citado artigo 267º, que “as competências sejam exercidas pela entidade mais bem
colocada em termos de perceção dos problemas e mais apta por essa proximidade a
dar lhes solução”. Novamente, a Constituição, refere no seu artigo 235º que a
organização democrática compreende a existência de autarquias locais, ou seja,
trata-se de uma questão democrática.
Certo que nenhum cidadão português
ficará, caso a reforma prossiga, sem a sua freguesia, no entanto, a questão prende-se
também com fatores históricos, sociais e culturais.
0 comentários:
Enviar um comentário