sábado, 17 de novembro de 2012

Os Particulares como Sujeitos das Relações Jurídicas Administrativas: A Doutrina dos Direitos Subjectivos Públicos


Desde os seus primórdios que o Direito Administrativo se vê confrontado, na prática jurídica, com as relações entre os administrados e a Administração. Estas relações administrativas têm, principalmente, relevância nos âmbitos procedimental e processual. Contudo, neste breve texto, o que se pretende é a mera exposição teórica do que faz a ponte entre o indivíduo e a Administração Pública: o direito subjectivo público.
Historicamente, é na segunda metade do século XIX que podemos assistir ao nascimento do conceito de direito subjectivo público - protagonizado pela doutrina alemã. Num tempo em que a consciência jurídica ia no sentido liberal, de individualismo e de separação entre Estado e Sociedade, os direitos subjectivos públicos surgem lado-a-lado com uma visão dos direitos fundamentais enquanto direitos contra o Estado, de esferas de autonomia a preservar da intervenção do Estado numa tentativa de criar uma obrigação de abstenção estadual no domínio do particular.
Mas os direitos subjectivos públicos não se confundem com os direitos fundamentais, como nos ensina o Prof. José de Melo Alexandrino: os primeiros são específicos do Direito Administrativo, enquanto os últimos se enquadram no Direito Constitucional; os primeiros decorrem da legislação e os outros, logicamente, da Constituição. Também não opera aqui nenhuma regra de consumpção - na medida em que os direitos subjectivos públicos pudessem ser uma modalidade de direitos fundamentais - os direitos fundamentais conferem ao particular variadissímas posições jurídicas, ao passo que o direito subjectivo é uma categoria muito especifica em que não pode nela ser incluída ou com ela confundida.
Destrinças à parte, temos então o particular enquanto sujeito de direitos face ao Estado: ora, o direito subjectivo publico será moldado tendo em conta a circunstância dos dois pólos da relação jurídica serem estruturalmente diferentes - numa relação com o Estado, está sempre implícita uma hierarquia. Não se trata de uma relação entre iguais como no Direito Civil.
Jellinek foi provavelmente o autor que mais contribuiu para a teorização deste conceito. Apresentava o direito subjectivo público como as pretensões jurídicas que o indivíduo oponha face ao Estado, legitimamente, pela sua condição de parte integrante do mesmo. Na prática, traduzia-se na capacidade de pôr em movimento normas jurídicas no interesse individual; na faculdade de atingir um reconhecimento jurídico do seu interesse.
Ao contrário do direito subjectivo privado, que se funda em faculdades pré-existentes, o direito subjectivo público tem a sua origem na exclusiva concessão do ordenamento jurídico. Assim considerado, podemos então caracterizar o direito subjectivo público como referente às relações entre o Estado - entidade que cria o direito - e o indivíduo.
Também se afigura relevante, ao tratar das construções clássicas deste conceito, referir a definição de Otto Mayer, que entendeu tratar-se do "poder jurídico sobre o exercício do poder publico".
Em Portugal, foi Rocha Saraiva quem trabalhou o conceito, definindo-o com a particularidade de observar como regra geral a não patrimonialidade das relações jurídicas que se estabelecem entre o Estado e as pessoas.
Distinguiu estes dos direitos subjectivos privados através do interesse: no direito subjectivo público assumiria uma forma colectiva e permanente, sendo reconhecido no ordenamento jurídico e permitindo o reflexo do indivíduo, não enquanto pessoa singular, mas enquanto membro da comunidade. Podemos encontrar na Doutrina outros critérios de distinção entre direitos subjectivos público e privados. Encontro, com maior peso, aquele que observa que nos direitos subjectivos públicos, o poder do particular que visa satisfazer um interesse seu é dirige-se contra aquele que lhe conferiu o poder ou faculdade, fenómeno que não acontece nas relações entre particulares,
Hoje, no Direito Administrativo, está em voga a distinção entre direitos subjectivos e interesse legitimo - vemos aqui uma oportunidade de relevância teórica da teoria dos direitos subjectivos públicos.
Na linha de Jorge Reis Novais, se o direito subjectivo público é o último e mais solido grau de subjectivação que o ordenamento jurídico reconhece na esfera do indivíduo. Não deixam, no entanto, de se manifestar outros graus de protecção de interesses nas relações dos particulares com o Estado e os entes públicos.
Podemos concluir então, que ser sujeito de um direito subjectivo público, se traduz numa pretensão jurídica face ao Estado, conferida pela lei - ou seja, consiste numa posição jurídica subjectiva do indivíduo na sua relação com o Estado.
Os direitos procedimentais dos administrados podem ser considerados direitos subjectivos públicos, na exacta medida em que lhe conferem a possibilidade de exigir ao Estado-Administração um determinado comportamento no âmbito do procedimento, que visa a satisfação de um seu interesse.
Resta apenas referir um último aspecto: quando é impedido ao titular do direito o seu exercício, este tem vários meios de defesa. Em primeiro lugar, os mecanismo próprio na lei do processo para se desencadear a actuação de outrem que permita o gozo do direito.  Mas em segunda instância, é também atribuído ao titular a faculdade de recorrer ao instituto da responsabilidade civil para que possa obter o pagamento de uma indemnização pelo danos que a recusa da prestação devida lhe possa ter causado. Quando se tratar de um acto ilícito, ou seja, que a recusa não tenha fundamento válido, o particular tem direito a obter um bem ou serviço do Estado-Administração nos termos do artigo 7º a 10º da Lei nº67/2007 de 31 de Dezembro.
Este é um tema bastante interessante do ponto de vista teórico, com muitos mais aspectos para referir para além dos que aqui foram desenvolvidos. Contudo, espero ter conseguido captar o essencial e o mais relevante para o programa em estudo.

Principal bibiografia consultada:
Jorge Reis Novais "Contributo para uma Teoria do Estado de Direito"
Vasco Pereira da Silva "Em busca do acto administrativo perdido"
José de Melo Alexandrino " Direitos Fundamentais - Introdução Geral"

Leonor Caldeira nº21936

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