terça-feira, 20 de novembro de 2012



Ao analisar o artigo 267.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) verifico que estão intrinsecamente relacionados princípios basilares que regulam a organização administrativa. No nº1 do artigo supra citado é referido “evitar a burocratização”, “aproximar os serviços as populações” e “assegurar a participação dos interessados na sua gestão efectiva”. Perante o nº2 destacamos “estabelecer adequadas formas de descentralização e de desconcentração administrativa, se prejuízo da necessária eficácia e unidade de acção e dos poderes de direcção e superintendência do Governo”.
Passo agora a analisar mais detalhadamente cada um dos princípios que retiro desta norma.


Ø  Princípio da Desburocratização
De acordo com este principio, a Administração Pública deve ser e estar organizada de forma célere e eficiente, facilitando toda a vivencia dos administrados. Para tal, cabe à Administração renovar, adequar as suas estruturas bem como os seus métodos de funcionamento para melhor atingir os seus objectivos. Sem a existência de um princípio assim, aumentariam as potencialidades de lesão das posições jurídicas dos particulares.
Como refere o Professor Marcelo Rebelo de Sousa este princípio incide sobre a estruturação administrativa contra-indicando estruturas desnecessariamente complexas, duplicações de atribuições ou competências, distanciamento excessivo entre as entidades administrativas e os particulares e entre os órgãos de instrução e de decisão e seus destinatários, bem como sobre o procedimento administrativo, opondo-se a procedimentos administrativos demasiado longos, lentos e formalizados e, dessa forma, não vocacionados para a adopção de decisões eficientes.
Está patente a sua verificações em vários preceitos normativos como por exemplo no artigo 57.º Código de Procedimento Administrativo (CPA) – dever de celeridade administrativa -, 58.º CPA – prazo geral para a conclusão de procedimentos administrativos -, e por últimos o nº2 alínea e) do Decreto-lei (DL) nº 135/99 “privilegiar os procedimentos mais simples, cómodos, expeditos e económicos”.

Ø  Princípio da Aproximação dos Serviços às Populações
Encontra-se no artigo 10.º CPA para além do artigo 267.º nº1. Este princípio determina a necessidade de Administração Pública ser estruturada para que se localize mais próximo possível da comunidade que visa servir.
Pela aproximação às populações existe uma necessidade de integrar serviços em pessoas colectivas publicas de menor âmbito territorial, compatível com a sua acção/eficácia, este princípio encontra-se relacionado com o princípio da subsidiariedade.

Ø  Princípio da Desconcentração e da Descentralização Administrativa
A desconcentração diz respeito a uma organização administrativa dentro de uma pessoa colectiva pública, estando ligada à distribuição vertical de poderes pelos seus diferentes órgãos. É a repartição de competências por órgãos de cada pessoa colectiva.
Esta desconcentração pode ser:
·         Concentrada quando o seu superior hierárquico for o único órgão competente para tomar decisões.
·         Desconcentrada quando o poder decisório se repartir entre o superior e um ou vários subalternos, com direcção e supervisão daquele.
A desconcentração pode ser:
·         Funcional ou Burocrática;

·         Territorial;

·         Originária, quando feita directamente pela lei;

·         Derivada, quando decorre de um acto de administração por ela habilitado (ex: delegação de poderes);

·         Horizontal – não coloca um órgão em supremacia sobre os demais;

·         Vertical – coloca um órgão em supremacia sobre os demais (ex: 199º d) e 271º nº2 e nº3 da CRP);

Uma estrutura Administrativa desconcentrada implica:
·         Uma maior eficiência da acção administrativa;
·         Uma maior rapidez de resposta permitindo uma melhor qualidade do serviço.
·         Em suma, maior eficiência, celeridade e qualidade na satisfação das necessidades colectivas que ela possibilita.
Desvantagens:
·         Implica múltiplos centros decisórios, o que pode inviabilizar a tomada de decisões harmoniosas.
·         Os subalternos encontram-se menos preparados para a decisão.

·         Risco de multiplicação de centros decisórios, muitas vezes, sem preparação ou com indesejáveis sobreposições de competência.


Já a descentralização exige que o exercício da função administrativa seja realizado por diversas pessoas colectivas além do Estado. Exemplo:
·         Regiões autónomas (RA) (225º e 288º o) CRP);
·         Autarquias Locais (AL) (235º e 288º n) CRP);
·         Universidades Públicas (76º nº2 CRP);
·         Associações Públicas (267º nº1 e nº4 CRP).
É de referir que algumas pessoas colectivas têm a sua existência dependente do legislador – prosseguem os fins do Estado e podem por ele ser criadas ou extintas, desde que seja assegurada a satisfação das necessidades colectivas a que correspondem as suas atribuições.
Tipos de descentralização:
·         Territorial – RA e AL;
·         Não Territorial – devolução de poderes (consentimento a pessoas colectivas de direito privado de tarefas materialmente administrativas);
·         Institucional – pessoas colectivas de substracto patrimonial (institutos públicos);
·         Addociativa – existência de pessoas colectivas de substrato associativo (associações e universidades públicas).

Vantagens da Descentralização:
·         Maior eficiência e celeridade da administração;
·         Maior democraticidade;
·         Especialização Administrativa;
·         Facilitação da participação dos interessados na gestão da administração;
·         Limitação do poder público através da sua repartição por uma multiplicidade de pessoas colectivas.

Desvantagens da Descentralização:           
·         Proliferação de centros de decisão;
·         Proliferação de património autónomos e de exigências de gestão financeira;
·         Alargamento do número de servidores públicos e muitos deles sem qualificações técnicas para o exercício de funções com apreciável nível de especialização.


Ø  Princípio da Eficácia e Unidade de Acção da Administração

A CRP estabelece que o Principio da Unidade deve ser assegurado pelo Governo, órgão superior da Administração Pública, ao qual compete:
·         Dirigir serviços e a actividade da Administração Directa do Estado;
·         Superintender na Administração Indirecta;
·         Exercer Tutela sobre a Administração Autónoma.
Para além da supremacia governamental, a unidade da acção pode justificar a centralização e a hierarquia onde sejam indispensáveis e na medida em que se mostrem adequadas.
O artigo 6º CRP proclama simultaneamente este principio da unidade com o da autonomia regional e da descentralização.
No artigo 267 CRP entende-se que o principio visa evitar que a descentralização e a desconcentração administrativas levem à perda da unidade do Estado, por via da pulverização de centros de decisão potencialmente desencontrados dentro da administração. Permite ainda atingir uma maior igualdade da actuação administrativa e dar sentido à responsabilidade politica ao Governo (182º CRP) perante a Assembleia (190º CRP).
Em suma, este princípio visa atenuar as desvantagens criadas pelos princípios da descentralização e desconcentração. Contudo não pode ser visto como um “contra-princípio” face a estes dois pois o seu âmbito de acção é tangente com os outros dois princípios. 



(continua na próxima publicação)


Jorge da Silva 
Nº 19691

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