As Relações
Administrativas:
Hierarquia, Superintendência e Tutela
O que passarei a analisar
não se assemelha a uma Administração Publica observada de uma forma estática no
sentido de uma separação mais ou menos vincada do que caracteriza a estrutura
da organização administrativa. Irei analisar as relações que se originam dentro
e entre as pessoas colectivas e os seus órgãos administrativos. Observar-se-á
uma visão intrapessoal e interpessoal. Será desta forma que conseguiremos
perceber mais claramente que a Administração não se coaduna com “acções
estáticas” pois, tanto numa forma como noutra, prevalece uma “agilidade
dinâmica que dá vida ao direito administrativo”.
As relações a que me
refiro estão patentes em dois artigos da Constituição da República Portuguesa,
nomeadamente nos artigos 199.º d) e 182.º. Refere este último “O Governo é o
órgão de condução de política geral e o órgão superior da administração
pública”. Tem-se como pedra basilar a relação de hierarquia, com uma posição de
vantagem do Governo face aos demais. Já o artigo 199.º d) refere que cabe ao
Governo no exercício de funções administrativas “Dirigir os serviços e a
actividade da administração directa do Estado, civil e militar, superintender
na administração directa do Estado e exercer a tutela sobre esta e sobre a
administração autónoma”. Por sua vez, na norma expressa estão referidos os dois
tipos de relação: superintendência e a tutela.
Hierarquia:
Começo assim a abordagem,
tratando da primeira relação enunciada, a hierarquia. Esta manifesta-se
verticalmente onde, 2 ou mais órgãos de uma mesma pessoa colectiva, estão
aglutinados por dois poderes distintos: o poder de direcção para o superior
hierárquico e o dever de obediência para o subordinado. O poder de direcção consiste em emanar ordens (directivas relativas
a um caso concreto e individualizado, especificado) ou instruções (para um caso
futuro não individualizado, abstracto). O superior hierárquico goza de uma
grande abrangência no que respeita aos subalternos, podendo emanar comandos
vinculativos em toda a área de competência do subalterno. Já o dever de obediência deve advir de um
acto legal e de um superior hierárquico legítimo e em matéria de serviço como
nos refere o artigo 271.º da Constituição da República Portuguesa. É importante
referir também o artigo 266.º nº2 não somente para o subalterno mas também para
o superior hierárquico, quando refere que “Os órgãos e agentes administrativos
estão subordinados à Constituição e à lei…”. No entanto, nem todas as ordens
são imposição de uma obrigação de obediência, tornando-se assim excepções ao
poder de direcção. Essas excepções estão presentes não só no artigo 271.º nº3
da Constituição (quando implique a prática de um crime) como em outros casos. Caso
como a observância de um comando oriundo do superior hierárquico que não se
mostre legitimo para o fazer gerando incompetência; quando essa ordem não for
realizada em matéria de serviço; quando não possua uma forma legal; se for nulo
não existem produção de efeitos como se retira da letra do 271.º nº3 já supra
citado.
Premente será também
referir que o superior hierárquico detém um poder de supervisão, que consiste numa legitimidade de revogar,
anular ou suspender (total ou parcialmente) actos dos subalternos. Outros poderes
se observam na esfera deste. São eles o poder
de inspecção – fiscalizar o poder dos subalternos e bom funcionamento dos
serviços -, poder disciplinar – carateriza-se
pela faculdade de punir o subalterno -, poder
de decidir recursos – faculdade de reapreciar os actos previamente
decididos pelos subalternos podendo revogar ou confirmar e, eventualmente,
substitui-los -, por último surge o poder
de decidir conflitos de competência que se encontra expresso no artigo 42.º
e 43.º do Código do Procedimento Administrativo.
Esta relação (hierarquia)
está muito patente na Administração Directa do Estado. Destaque da relação
hierárquica sob forma vertical trazendo subjacente a si algumas vantagens. São
elas uma repartição de competência entre órgãos, uma identificação escalonar da
responsabilidade, critérios de resolução de litígios e melhor prossecução do
interesse público e, por último, prevalência da vontade do superior
hierárquico.
Superintendência:
Passo agora a caracterizar
a relação de superintendência. Este poder é conferido ao Estado, exercido pelo
órgão superior da Administração Pública – Governo -, bem como a outras pessoas
colectivas de fins múltiplos para definir objectivos e guiar a actuação de
pessoas colectivas de fins singulares colocadas pela lei na sua subordinação.
Observa-se assim uma devolução de poderes da parte da administração directa
passando esta a estar ligada à administração indirecta. Esta relação não é, nem
pode ser, presumida, sendo condição “sine qua non” da sua existência a
expressão na lei.
Tutela:
Por último, passo a
caracterizar a relação de tutela. Esta consiste num conjunto de poderes de
poderes de intervenção de uma pessoa colectiva pública na gestão de outra
pessoa colectiva pública a fim de assegurar a legalidade e/ou o mérito da sua
actuação. Deste modo, caracteriza-se pela existência de duas pessoas colectivas
públicas; fim da tutela administrativa é assegurar em nome da entidade que
tutela (entidade tutelar) que a entidade tutelada cumpra as leis em vigor e
garantir que sejam adoptadas medidas as soluções convenientes e oportunas para
a prossecução do interesse público. Esta relação tem o seu relevo na
administração indirecta e autónoma do Estado. Friso que tal como a
superintendência só a tutela quando e nas formas previstas na lei.
Quanto ao fim da tutela,
este pode ser de legalidade (visa controlar a legalidade das decisões) ou de
mérito (fiscalizar a conveniência e oportunidade das decisões).
Quanto ao conteúdo, a
tutela pode ser inspectiva – poder
de fiscalizar a organização, funcionamento de órgãos ou serviços, os documentos
e as contas -, integrativa – aprovar
os actos ou autorizar -, sancionatória
– aplicar sanções por irregularidades que tenham sido detectadas pela entidade
tutelada -, revogatória – poder de
revogar ou anular os actos administrativos -, substitutiva – suprir omissões, praticando os actos que forem
legalmente devidos.
Nota:
quanto às autarquias locais, estas estão sujeitas a tutela de legalidade,
estando somente sujeitas, quanto ao conteúdo, a tutela inspectiva e
integrativa.
Nota
1:
A Administração Autónoma está normalmente sujeita a tutela. Há casos de total
imunidade tutelar. São os casos das ordens profissionais e demais associações
públicas que estão sujeita somente a um controlo judicial da sua actuação.
Jorge Silva
Nº 19691
Nº 19691
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