quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Direitos subjectivos públicos, a norma de protecção e os Direitos fundamentais



É o reconhecimento dos direitos subjectivos que faz com que o individuo deixe de ser tratado como um objecto de poder e passe de a ser visto como um “cidadão” transformando-se num sujeito de direito com condições para estabelecer e impor relações jurídicas com os órgãos do poder público. Portanto, pode-se concluir que o reconhecimento de direitos subjectivos constituem o fundamento de validade para a admissibilidade de relações jurídicas entre o cidadão e o Estado.

O reconhecimento dos direitos fundamentais implicou um equilíbrio das posições entre particulares e Administração, tendo o individuo uma posição paritária perante a administração, transformando-se esta num “centro de imputação objectiva de direitos e deveres” (Soriano Garcia)

O princípio fundamental da dignidade da pessoa humana, sendo um dos princípios basilares do Estado de Direito , traduziu-se em direitos subjectivos perante a autoridade Administrativa (anteriormente agressiva e autoritária) que permitiram ao particular ter acesso a acções de defesa contra a Administração pública, nomeadamente meios de defesa preventiva dos seus direitos, tendo tanto o legislador (que na sua actuação tem de considerar os direitos fundamentais) como a administração de actuar em conformidade com os direitos fundamentais.

Ao nível do contencioso administrativo o reconhecimento dos direitos subjectivos públicos aos indivíduos tem efeitos práticas, havendo um processo administrativo que tutela esses mesmos direitos o que acarreta consequências no plano jurídico- administrativo.

No entanto, apesar da importância dos direitos fundamentais para o reconhecimento dos direitos dos particulares face á administração, pode-se afirmar que estes se viram desvalorizados com a inclusão da “Teoria da norma de protecção”.

A “Teoria da norma de protecção “define que o particular é parte das relações com a administração e que existe protecção das posições jurídicas individuais. Esta teoria consagra os direitos dos particulares face a administração, sendo o critério relevante de averiguação da existência, ou não existência, de direitos subjectivos o do sentido da norma, ou seja, o da determinação dos interesses protegidos pela norma jurídica.

Tal como Maurer descreve “a doutrina dos direitos subjectivos públicos (…) afirma a existência de um direito subjectivo público quando uma disposição jurídica vinculativa (e da qual, por isso, resulta um dever jurídico da Administração) não é determinada unicamente para servir o interesse público , mas antes – ou pelo menos, também – os interesses individuais dos cidadão”.

Surge através desta teoria uma nova concepção de direito subjectivo púbico, havendo também:

· O alargamento do âmbito da aplicação dos direitos dos privados

· Aumento do número de direitos considerados, que derivam do novo posicionamento do individuo face á administração.

· Alteração no modo de avaliação do interesse protegido em diversas normas (normas jurídicas que eram vistas como meios de protecção do interesse público passaram a ser vistas como meios de protecção de interesses individuais).

No entanto, a ” Teoria da norma de protecção” pecava pelo seu excessivo carácter normativo, sendo este o único meio de atribuição de direitos subjectivos.

 

Esta teoria revelou-se insuficiente face às alterações sofridas na administração dos dias de hoje, nomeadamente as decorrentes do surgimento da administração infra-estrutural cujas actuações produzem efeitos que vão além dos imediatos destinatários, incidindo as actuações em áreas com escassa densidade normativa. Desta forma voltou a estar em causa a protecção jurídica dos privados face á administração.

Nos novos casos não se podia dizer que as normas jurídicas aplicáveis protegiam os interesses dos privados pois estas eram desprovidas de conteúdo material. Na maioria dos casos apenas determinavam alguns objectivos a serem prosseguidos.

Estávamos perante uma crise legalista onde a norma jurídica se mostrava insuficiente e limitadora na protecção dos indivíduos face a novas situações administrativas mal previstas, havendo uma crise nos direitos subjectivos públicos que até aqui eram definidos pelo legislador ordinário que se esquecia que os direitos subjectivos podiam igualmente resultar da Constituição, de normas regulamentares, ou mesmo de actos administrativos assim como de contratos em que interviesse a Administração.

Ou seja, como refere o Prof Vasco Pereira da Silva: “prestava-se muita atenção à lei, no que dizia respeito à fundamentação dos direitos subjectivos, mas era quase esquecida a necessidade de se olhar para o direito”.
Este facto era evidente no que respeitava aos direitos fundamentais, apesar da “Teoria da norma de protecção” ter o objectivo de alargar os direitos subjectivos públicos, o seu fundamento na lei tornou-se obsessivo pondo de parte, no esquecimento, qualquer outra fonte.

A administração moderna, que é prestadora einfra-estrutural, conduziu ao tratamento unitário de todos os direitos subjectivos dos particulares perante a Administração resultem estes de leiconstitucional ou ordinária, de regulamento, acto ou contrato administrativo.

É de realçar que foi a jurisprudência, e não a doutrina, que realçou a necessidade de, no Estado pós-Social, ser necessário proceder-se ao alargamento da noção de direito subjectivo para uma completa protecção dos privados.

Quanto a Portugal

Segundo os artigos 1º, 2º, 18º nº1, 268º nos. 4 e 5 da Constituição a ordem jurídica portuguesa trata os indivíduos como sujeitos de direito, titulares de direitos subjectivos perante as autoridades públicas e susceptíveis de estabelecer ligações com a Administração.

O regime português consagra amplamente as fostes de onde provêm os direitos subjectivos públicos sendo estas:

· Constituição

· Direito Internacional

· Lei ordinária

· Regulamentos

· Actos administrativos

· Contratos

O estatuto jurídico dos particulares e da administração e da relação entre os dois estabelecesse através do Direito e não apenas da lei.
A consagração, e a devida valorização, de direitos fundamentais (que são direitos subjectivos públicos e simultâneamente elementos objectivos da ordem jurídica) possibilitam que haja a protecção de particulares que não vêm a sua lesão protegida em legislação ordinária nem são destinatáriosde actos administrativos, sendo estes direitos um meio de fundamento para a sua protecção.

Bibliografia:

Tese de doutoramento Prof. Vasco Pereira da Silva "Em Busca do Acto Administrativo Perdido"

Marisa Gomes

nº 21935

 

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