sábado, 27 de abril de 2013


O Procedimento Administrativo como figura central do Direito Administrativo e a participação dos particulares

Na dogmática tradicional, o que relevava era, como se sabe, o acto administrativo, uma vez que estávamos perante uma Administração agressiva, “actocêntrica” e autoritária, onde aos particulares não eram garantidos direitos perante a máquina estatal. Neste contexto, o procedimento administrativo valia enquanto instrumento ao serviço do acto administrativo e não autonomamente. O acto administrativo, pelo contrário, era a figura central do Direito Administrativo, pois, sendo um acto unilateral de autoridade praticado pela Administração para decidir situações individuais em casos concretos, ou seja, um acto através do qual a Administração, mediante o exercício de um poder público de autoridade, impunha um dado comportamento ao particular, sendo que, para agir contra estes actos existem garantias administrativas e garantias contenciosas dos particulares.
A dogmática tradicional foi, no entanto, posta em causa por parte da doutrina italiana, que entendia que o procedimento administrativo (série de condutas de lógica interna e orientados para a produção ou execução de uma decisão administrativa) devia passar a ser visto como a figura central de Direito Administrativo. Entendia-se que tal perspectiva apresentaria duas vantagens relativamente à doutrina tradicional: a possibilidade de uniformização do tratamento dogmático de toda a actividade administrativa e a possibilidade de entender a integralidade da actividade da Administração. A primeira vantagem remete para o facto de que nenhuma decisão da Administração se esgota com um único acto, a actuação da Administração é o resultado da sequência de um procedimento. Já a segunda vantagem significa que só o procedimento permite ter em conta todas as actuações da Administração, possibilitando a análise da actuação no seu todo.
No cerne do procedimento administrativo está a possibilidade da participação dada aos seus intervenientes, o particular e as autoridades administrativas. O particular pode intervir no processo de decisão da Administração, nomeadamente através de institutos como a audiência prévia.
Refira-se, porém, que neste sector da doutrina italiana, aquilo que é defendido é que é importante que o particular participe no processo de decisão da Administração, não para se defender, mas sim para poder trazer novos factos ao procedimento. Esta orientação tende à objectivização do Direito Administrativo, pois apenas atende à própria função administrativa.
Contudo, o mesmo não se passa na doutrina alemã, pois os germânicos consideram que é a relação jurídica que é a figura central de Direito Administrativo, havendo uma subjectivização deste relativamente às posições jurídicas dos particulares e das autoridades administrativas. É esta a posição defendida pelo Prof. Vasco Pereira da Silva, que entende ser a mais adequada ao direito português.
E que dizer da participação dos cidadãos no procedimento administrativo? Em primeiro lugar, tal permite exercer o controlo do poder administrativo e a melhor qualidade das decisões administrativas, constituindo um factor de legitimação da Administração Pública (até porque esta hoje tem um maior campo de actuação em todos os níveis por se ter tornado prestadora) e aperfeiçoamento do Estado de Direito. A própria Constituição da República Portuguesa consagra este direito aos particulares (267º, nº 5), tal como o Código do Procedimento Administrativo (8º), que dá aos particulares a oportunidade de defenderem os seus interesses, os seus direitos subjectivos. Os particulares colaboram, por conseguinte, com a Administração, sendo que se estabelece uma relação jurídica procedimental entre os dois que permite uma maior eficácia da decisão administrativa.
Também a participação no procedimento pode ser entendida de maneira objectiva (privados intervêem de modo a facilitar a tomada de decisões da Administração) e de maneira subjectiva (privados intervêem como instrumento de defesa prévia das suas posições jurídicas perante a Administração). O primeiro ponto de vista é o adoptado pelo Prof. Rui Machete. O segundo é defendido pelo Prof. Gomes Canotilho, que reforça a função da garantia dos direitos fundamentais.
Por fim, importa referir que, segundo o Prof. Vasco Pereira da Silva, os direitos fundamentais têm conteúdo substantivo e ainda garantias de procedimento, como tal, a não audiência de um particular interessado viola o conteúdo essencial de um direito fundamental, pelo que uma decisão tomada sem a audiência do particular deve ser nula nos termos do 133º nº 2 do CPA. Em relação ao 103º nº 2 b), deve interpretar-se que na dispensa de audiência dos interessados, os elementos do procedimento já devem permitir deduzir se a decisão vai ser favorável ou desfavorável, sendo que, quando for desfavorável, deverá ser fundamentada ao particular.

Bibliografia:
Vasco Pereira da Silva “Em busca do acto administrativo perdido”;
Diogo Freitas do Amaral “Curso de Direito Administrativo” Volume II.

Diana Furtado Guerra
Nº 21984

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