sexta-feira, 26 de abril de 2013

Administração: Acção ou Relação? - Qual o conceito central da actividade Administrativa?



A discussão sobre qual será o conceito base de toda a actividade administrativa não é nova. Com efeito, desde o seu "berço", que o direito administrativo procura delimitar a sua actuação com base num conceito central, que encerre em si a realidade da Administração. E podemos dizer que temos dois conceitos que se candidatam ao título: o acto administrativo e a relação jurídica administrativa.
O acto administrativo é o principal instrumento de trabalho da Administração, isto porque para prosseguir o interesse público a Administração faz escolhas e opções, que se concretizam com decisões, que são tomadas precisamente através de actos. Perante esta noção, não será difícil compreender porque é que os liberais optaram pelo acto administrativo como ponto central do Direito Administrativo.  O  acto administrativo encaixava na perfeição na ideia de exercício de poder e de autoridade, tão apreciada pelos revolucionários, em nome da separação de poderes. Com efeito, o acto administrativo começou por delimitar o espaço de acção da Administração, no qual ninguém poderia intervir, incluindo os tribunais comuns.  Contudo, é certo que, aquando da criação de tribunais administrativos, após o famoso conselho de Estado francês de 1799, o acto administrativo passou igualmente a ter uma função definidora do direito administrativo, vinculando a Administração ao direito. Começa aqui um “milagre”, que permitirá que o direito administrativo se vá lentamente afirmando com o fim, não de proteger a próprio administração, mas sim os particulares face à administração. Resumindo, o acto administrativo começou primeiro por ser uma garantia da administração, e só depois uma garantia para os particulares.

Perante esta evolução, em que aos poucos e poucos a Administração vai perdendo o seu “trauma” liberal, e ficando cada vez mais próxima do Estado prestador dos dias de hoje, o acto administrativo vai perdendo força, e o peso da actividade administrativa demasiado para ser carregado pelo acto. Torna-se urgente substituir o acto como conceito central, para algo mais amplo. Em Itália fala-se no procedimento, e na Alemanha a relação jurídica. Entre estes dois, claramente, se queremos um conceito que abarque a nova estrutura mais aberta e complexa da Administração, não há dúvida de que a relação jurídica é mais abrangente do que o procedimento, conforme veremos mais adiante. A relação jurídica é, segundo Bauer uma “ligação constituída pelo direito entre dois ou mais sujeitos”, neste caso, especificamente, constituída pelo direito administrativo. Vemos então que é um conceito capaz de abarcar a realidade actual da administração prestadora, onde os particulares têm um maior envolvimento com a Administração Pública. O instituto da relação jurídica vence assim as limitações do acto administrativo, adptando-se ao novo formato da administração e, por outro lado, sem trazer grandes cortes uma vez que integra em si mesma o acto administrativo, e o próprio procedimento administrativo.

Mas há quem sustente que, de facto sendo a relação jurídica o conceito mais indicado para se estruturar o Direito Administrativo, isto é, para ser o seu centro, que, nos dias de hoje já não faz sentido falar de um centro para o direito administrativo. Isto porque se é verdade que no Direito Administrativo a evolução se fez em direcção a uma lógica cada vez mais relacional, a verdade é que essas relações se afirmam cada vez mais como relações jurídicas multifacetadas, e multilaterais, e tudo isto revela uma postura aberta da nova ciência do Direito Administrativo. Portanto, para os defensores desta nova tese, já não faz sentido falar-se num centro para um direito administrativo com visões amplas e atitudes de abertura em relação, nomeadamente a outros ramos do direito, por exemplo, direito do urbanismo, ou do ambiente. Seja como for, a verdade é que isto não invalida nem diminui o papel da relação jurídica no Direito administrativo que, não sendo central, de acordo com estes autores é, no mínimo, imprescindível para toda e qualquer actuação administrativa.

Concluindo,  e respondendo à pergunta inicial, a Administração é relação, ou seja, a sua actividade consiste essencialmente em estabelecer relações com outros sujeitos de direito, agora, em que grau e até que ponto faz sentido continuarmos a insistir num conceito central de relação jurídica administrativa é o que se discute na actualidade.


Luísa Mendonça, nº 22000


  • AMARAL, Diogo Freitas do, Curso de Direito Administrativo, vol. II, Almedina, 2012
  • SILVA, Vasco Pereira da, Em Busca do Acto Administrativo Perdido, Almedina, colecção teses, 2003

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