segunda-feira, 15 de abril de 2013

Ilegalidade do acto administrativo


A ilegalidade dos actos administrativos deve ser entendida como uma ilegalidade ampla, que engloba o respeito por todo o bloco legal que incide sobre o acto.

Um acto administrativo pode sofrer de ilegalidade orgânica, formal ou material. Os vícios (formas específicas que a ilegalidade pode assumir) que conduzem à ilegalidade orgânica são os vícios de usurpação de poderes e de incompetência. Os vícios resultantes em ilegalidades formais são precisamente os vícios de forma, enquanto a ilegalidade material pode ocorrer por desvio de poder ou violação da lei(em sentido estrito).
Alguma doutrina, baseando-se no artigo 268º/4 da CRP, defende que é desnecessária a especificação do vício, bastando a invocação da ilegalidade e a demonstração da lesão.
O Professor Freitas do Amaral, por sua vez, afasta-se desta posição na medida em que considera a especificação dos vícios essencial por motivos de celeridade processual, clareza e economia. O Prof. entende também que não cab  à CRP se debruçar sobre questões técnicas a não ser que as mesmas ofendam direitos fundamentais. Ora, quanto a esta questão, estaríamos de facto perante um problema caso um erro inicial na qualificação do vício não pudesse vir a ser sanado e pusesse em causa a validade do procedimento da invocação da ilegalidade. Tal não acontece, logo, não haveria motivo para retirarmos tal conclusão do dito artigo. Completando a posição do Professor, temos os artigos 78º/2g, 85º/3 e 95º/2 do CPTA, os quais estabelecem a exigência de exposição dos factos e razões que fundamentam a acção e referem-se a “causas de invalidade”.
Afastando a dúvida quanto à necessidade de qualificação específica, passemos à análise dos 5 vícios.


Usurpação de poder:


A usurpação de poder consiste numa violação do princípio da separação de poderes, através da prática por um órgão administrativo de um acto que caiba ao:

- Poder legislativo (ex: a criação de um imposto por acto administrativo, em violação do artigo 165º/1g da CRP)
- Poder moderador (ex: um despacho do Primeiro-Ministro a demitir um funcionário da Presidência da República)
- Poder judicial (ex: deliberação de uma Câmara Municipal que declare a nulidade de um contrato civil)

Incompetência:


Estamos perante um caso de incompetência quando um órgão administrativo pratica um acto pertencente a outro órgão administrativo.
A incompetência pode ser relativa ou absoluta conforme se reporte a actos pertencentes a outro órgão da mesma pessoa colectiva ou a outra pessoa colectiva ou ministério.
Outro critério de distinção é o da incompetência em razão da hierarquia, da matéria, do lugar e do tempo. Um exemplo da primeira é o caso de um subalterno praticar actos da competência do superior. Temos incompetência em razão do lugar por exemplo no caso de uma Câmara Municipal praticar actos da competência de outra. A incompetência em razão da matéria resulta de actos praticados em desrespeito pela distribuição das atribuições em função da natureza do assunto. A incompetência em razão do tempo deriva da regra geral, segundo a qual os actos administrativos são praticados em relação ao presente.
Os vícios de incompetência e de usurpação de poderes têm conceitos próximos mas distinguem-se no sentido em que usurpação de poderes implica invasão da esfera de outro poder do Estado, enquanto incompetência só inclui actos pertencentes a outra autoridade administrativa.

Vício de forma:


Este vício consiste na carência de forma legal e na preterição de formalidades essenciais anteriores à prática do acto (p.e: audiência prévia) ou relativas à prática do acto (p.e: regras de votação). As formalidades posteriores geram apenas ineficácia, visto que a validade do acto administrativo se afere consoante a conformidade com o ordenamento jurídico no momento em que o acto é praticado.


Violação da lei:


Estamos perante violação da lei quando existe uma discrepância entre o conteúdo ou objecto do acto e a norma que lhe é aplicável. Existem várias modalidades de violação da lei:
- falta de base legal
- erro na interpretação, integração ou aplicação das normas
- incerteza, impossibilidade e ilegalidade do conteúdo do acto
- incerteza, impossibilidade e ilegalidade do objecto do acto
- inexistência ou ilegalidade dos pressupostos relativos ao conteúdo ou objecto
- ilegalidade dos elementos acessórios incluídos no acto (condição, termo e modo) desde que a ilegalidade seja relevante
- qualquer outra ilegalidade que não caiba nos restantes vícios

Desvio de poder:



Existe desvio de poder quando no exercício de um poder discricionário, haja uma discrepância entre o fim legal e o fim real. Para averiguar se há ou não desvio de poder, há que apurar qual o fim visado pela lei ao atribuir tal poder (fim legal); qual o fim de facto prosseguido com a prática do acto (fim real); se existe coincidência ou não entre os dois. Não existindo, trata-se de desvio de poder.
Distingue-se entre desvio de poder para fins de interesse público e para fins de interesse privado. Para haver anulação com base no 1º caso, basta que haja erro, enquanto a anulação no 2º caso exige a existência de dolo.
Esta distinção é no mínimo bizarra na medida em que basta procedermos a uma análise partindo do senso comum para concluirmos que o 2º caso é bem mais grave, devendo bastar o erro para invocar a anulabilidade.
O desvio de poder é um vício próprio do poder discricionário, enquanto a violação da lei, contrariamente àquilo que se defendia até há pouco tempo, pode existir em relação a poderes vinculados e a poderes discricionários, não obstante ser logicamente mais comum nos primeiros. Existe violação de lei na prática de poderes discricionários quando haja violação dos princípios gerais que condicionam ou limitam o acto discricionário, como o princípio da imparcialidade, da boa fé, da justiça, da igualdade e da proporcionalidade.

 Leonor Carvalho, nº 21036, sub1

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