Acto Administrativo como conceito central do Direito Administrativo no Estado Liberal.
A noção de acto administrativo nasce em França, intimamente lligada com o contencioso Administrativo. Segundo Fursthoff, o acto administrativo teria por finalidade a garantia de uma protecção jurídica eficaz do cidadão contra o poder público. No entanto, a noção de acto administrativo vai passar por duas fases distintas que correspondem também elas aos dois períodos de evolução do contencioso administrativo:
- Segundo o professor Freitas do Amaral. o primeiro período corresponde à delimitação das acções da Administração Pública excluídas por lei da fiscalização dos tribunais judiciais;
- O segundo período corresponde à jurisdicionalização do acto administrativo, em que este passa a ter uma função de proteção das garantias dos particulares.
Desta feita, e durante o estado liberal, o conceito de acto administrativo é visto por duas perspectivas diferentes, mas complementares. Por um lado é encarado como um privilégio da Administração, sendo o seu primordial modo de actuação. Por outro lado, e visto como um instrumento de protecção dos particulares face à actuação do poder público. Em suma, o acto administrativo era, portanto, o modo de actuação da Administração pública. Como veremos mais à frente, este paradigma vai sofrer uma forte crise que o vai tornar apenas numa das muitas formas de actuação da Administração.
A crise do Acto Administrativo
O aparecimento da Administração infraestrutural e de novas formas de actuação da Administração, fez surgir uma nova dimensão do Acto administrativo. Coloca-se agora a questão da sua eficácia relativamente a terceiros, o que até ali não tinha sido problema na medida em que apenas se considerava a relação administração-particular. No entanto, é também nesta altura que se mostram as primeiras debilidades conceptuais da noção de acto administrativo, tal como ela fora concebida pela doutrina francesa. Instala-se assim a chamada crise do Acto Administrativo.
A proliferação de decisões genéricas, o multiplicar de decisões administrativas programáticas, entre outros fenómenos atinentes ao desenvolvimento infraestrutural administrativo, veio, nas palavras do professor Vasco Pereira da Silva, " chamar à atenção para a necessidade de considerar autonomamente a questão das relações jurídicas entre diferentes autoridades administrativas, assim como realçar o papel do procedimento administrativo.
Assim sendo, com a evolução dogmática e conceptual, tanto do acto administrativo, como da própria administração, e da maneira como esta é entendida, o acto passou a ser apenas mais uma das formas de actuação da administração. Muitas outras formas foram surgindo, fazendo com que aquela que fora o grande paradigma da administração entrasse em crise sendo, por vezes, desconsiderada enquanto forma de actuação da administração pública.
As alternativas doutrinais ao Acto Administrativo
A) Doutrina Alemã:
A doutrina alemã assume hoje a posição maioritária de considerar a relação jurídica como novo paradigma do Direito administrativo ( posição que é também partilhada pelo professor Vasco Pereira da Silva). Não obstante existirem grandes divergências no seio da doutrina quanto ao modo de conceber a relação jurídica administrativa, surgem-nos duas orientações essenciais :
- Um entendimento restrito, que faz depender a concretização da relação jurídica do facto jurídico que lhe deu origem;
- um segundo entendimento, desta feita amplo, que entende a relação jurídica como um instituto cuja criação é directamente realizada pela norma jurídica.
De acordo com o entendimento do professor Vasco Pereira da Silva, o aparecimento da relação jurídica como paradigma do Direito administrativo, " possibilita o tratamento do particular como um sujeito de Direito, numa posição inicial de igualdade perante a administração". Por isso mesmo, a relação jurídica acentua os direitos individuais e fundamentais dos cidadãos, tornando a posição dos particulares face à administração substancialmente mais forte. No entanto, e apesar das vantagens indicadas, esta doutrina tem suscitado criticas por parte de autores renomados, como por exemplo, Maurer, Krause, entre outros.
B) Doutrina Italiana:
Também a doutrina Italiana tentou ocupar as lacunas provocadas pela crise do acto administrativo, elevando o procedimento administrativo a conceito essencial e central do Direito Administrativo. De acordo com um número considerável de autores da doutrina italiana, o procedimento deve passar a ser visto como a grande alternativa dogmática ao acto administrativo. É importante referir que para a doutrina clássica, o procedimento seria considerado apenas para explicar a formação da decisão final da administração e, portanto, tinha um papel subalterno relativamente ao acto administrativo.
Segundo esta corrente, o procedimento iria permitir a uniformização do tratamento dogmático de toda a actividade administrativa e, por outro lado, conferiria a possibilidade de entender a actividade da administração, assim como o seu relacionamento com os particulares.
Em suma, este modelo permitiria alterar a lógica de "administração burocratizada", e acentuar o papel da participação dos cidadãos , permitindo a "intensificação, valoração, comparação dos interesses e a definição do interesse público" - Nigro.
Beatriz Gonçalves
aluna nº 21960
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